A tributação da vantagem acessória (habitação) atribuída ao trabalhador dependente, por Paula Margarido
O Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) incide sobre o valor anual dos rendimentos mencionados nas categorias elencadas no número 1, do artigo 1.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (adiante abreviadamente designado pela sigla CIRS) depois de efetuadas as correspondentes deduções e abatimentos. E os rendimentos, quer em dinheiro, quer em espécie, ficam sujeitos a tributação.
A contrapartida a que o trabalhador tem direito por virtude do trabalho prestado, num âmbito de contrato de trabalho, ou outro equiparado, em que existe uma relação de subordinação jurídica, é considerada a sua retribuição. E esta compreende a retribuição base e outras prestações regulares e periódicas, atribuídas ao trabalhador, em dinheiro ou em espécie.
As prestações em espécie são as prestações retributivas não pecuniárias que se destinam à satisfação das necessidades pessoais do trabalhador, ou da sua família, que não lhes pode ser atribuído valor superior ao corrente na região (da prestação de trabalho) e o seu valor não pode exceder o da parte em dinheiro, salvo o disposto em instrumento de regulamentação coletiva de trabalho – conforme (cfr.) o disposto no artigo 259.º do Código do Trabalho (CT).
Logo, as prestações retributivas em espécie podem abranger uma parte significativa da remuneração do trabalhador até ao limite de metade do seu valor global.
Vejamos que a alínea a) do número (n.º) 1, do artigo 2.º do CIRS refere que se consideram rendimentos da categoria A todas as remunerações pagas ou colocadas à disposição do seu titular, provenientes de um contrato de trabalho ou de outro a ele legalmente equiparado. E o número 2, do citado artigo 2.º menciona que as ditas remunerações compreendem, designadamente, os ordenados, os salários, vencimentos, gratificações, percentagens, comissões, participações, subsídios ou prémios, senhas de presença, emolumentos, participações em multas e outras remunerações acessórias, ainda que periódicas, fixas ou variáveis, de natureza contratual ou não. Ora, e nos termos da alínea b) do número 3, do aludido artigo 2.º, as aludidas remunerações acessórias compreendem todos os direitos, benefícios ou regalias não incluídos na remuneração principal do trabalhador que sejam auferidas devido à sua prestação de trabalho, ou em conexão com esta, e constituam para o respetivo beneficiário uma vantagem económica, sendo elencados nos números 1 a 10 da aludida alínea b), e a título exemplificativo, algumas dessas remunerações acessórias.
Detenhamo-nos, então, no número 4, da alínea b) do número 3, do artigo 2.º, que refere como remuneração acessória a atribuição ao trabalhador de subsídio de residência, ou equivalente, ou a utilização de casa de habitação, que constitui um rendimento em espécie.
Ora, e sendo um rendimento em espécie, já sabemos que não poderá ultrapassar metade do valor global da remuneração do trabalhador (cfr. o disposto no artigo 259.º do CT). E a sua equivalência pecuniária, para efeitos de cálculo do rendimento coletável na esfera do trabalhador, é estabelecida de acordo com as regras vertidas no número 2, do artigo 24.º do CIRS que ditam o seguinte: “Quando se tratar da utilização de habitação o rendimento em espécie corresponde à diferença entre o valor do respetivo uso e a importância paga a esse título pelo beneficiário, observando-se na determinação daquele as regras seguintes: a) O valor do uso é igual à renda suportada em substituição do beneficiário; b) Não havendo renda o valor do uso é igual ao valor da renda condicionada, determinada segundo os critérios legais, não devendo, porém, exceder um terço do total das remunerações auferidas pelo beneficiário; c) Quando para a situação em causa estiver fixado por lei subsídio de residência.
Pelo exposto, e tratando-se de habitação fornecida pela entidade empregadora sem pagamento de renda, infere-se que para além daquele rendimento, em espécie, não puder ultrapassar metade do valor global da remuneração do trabalhador, igualmente, não poderá, e para efeitos de rendimento tributável (no uso da dita habitação) o valor da renda condicionada exceder um terço do total das remunerações auferidas pelo beneficiário.
Este tipo de rendimento em espécie (alojamento) de trabalho dependente (categoria A), e nos termos da segunda parte da alínea a) do número 1, do artigo 99.º do CIRS, não está sujeito a retenção na fonte.
A verdade é que o valor deste tipo de rendimento em espécie deve constar, quer no recibo de remuneração, quer na “Declaração Mensal de Remunerações” (DMR) com o código A63, cujas últimas instruções de preenchimento foram aprovadas pela Portaria 30-A/2019, de 23 de janeiro, e integra a base de incidência contributiva, para efeitos de Segurança Social, tal como previsto na alínea m) do n.º 2, do artigo 46.º do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social.
Nesta sede, e em jeito de conclusão, não poderemos deixar de referir que o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, relativo ao Proc. n.º 00577/2004 (Viseu) aos 8 de novembro de 2007, e em que foi Relatora, a senhora Juíza Desembargadora Fernanda Brandão, expendeu o seguinte: “(…) as vantagens acessórias são remunerações acessórias consideradas rendimentos do trabalho dependente e tributadas nos termos do artigo 2.°, n.° 3, alínea c), 4) do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (…)”. resulta da prova produzida que os Impugnantes residem na casa cuja renda e
electricidade é paga pela entidade patronal constituindo num benefício para os Impugnantes, qualificável como vantagem acessória e consequentemente tributável na categoria A de IRS, artigo 2.º, n.º 3, alínea c), 4 e 23.º n.º 2, ambos do CIRS (…) Pelo que bem andou a Administração Tributária ao acrescer aos rendimentos dependentes declarados, a renda de casa e despesa de electricidade, pagas pela empresa (…)”.
Artigo escrito no âmbito da “Pós-Graduação em Fiscalidade Avançada da Católica Porto Business School”
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