
Entrevista Vida Judiciária – Restrições ao Golden Visa no Investimento Imobiliário
Entrevista Vida Judiciária – Restrições ao Golden Visa no Investimento Imobiliário
P: Ao longo dos anos, foram adotadas várias medidas que visaram simplificar e dar maior celeridade aos processos de Golden Visa, entende que as medidas adotadas foram suficientes, ou existem ainda aspetos a melhorar?
João Ribeiro Pereira: Ainda que se aplaudam algumas das medidas que têm vindo a ser implementadas no âmbito do procedimento de concessão das Autorizações de Residência para atividade de Investimento (Visto Gold), a verdade é que existem ainda vários aspetos de todo o processo que podem e devem ser melhorados, e que permitirão que o processo corra de forma menos burocrática e mais fluída.
Desde logo, a eficiência e rapidez na análise dos processos submetidos. Atento o hiato temporal (chamemos assim para não dizer atraso) que ocorre desde a submissão online do processo, a validação/pré aprovação online e o agendamento por parte do SEF e a consequente deslocação presencial aos serviços, a validade dos documentos submetidos já expirou. Este lapso temporal entre a submissão online e a entrega presencial faz com que a grande maioria dos investidores tenha que emitir os seus documentos vezes e vezes sem conta, em países que por vezes não têm em seu território representações consulares portuguesas.
Em segundo lugar, e à semelhança do que já está adotado para outros vistos, diminuir as deslocações presenciais e privilegiar a via digital, ou, permitir que a entrega presencial dos documentos seja feita por mandatário devidamente constituído ao invés da obrigatoriedade de o ser feito por parte do requerente/investidor. Creio que, tal como para as renovações de outros títulos de residência, seria profícuo que as renovações de ARI passassem a ser efetuadas por via online, dado que se trata apenas de uma mera submissão de documentos que maioritariamente já foram anteriormente disponibilizados ao SEF aquando da concessão do ARI por forma a aferir a manutenção dos requisitos. Quanto à recolha dos dados biométricos, a mesma torna-se dispensável, uma vez que, à partida, não ocorreram alterações! Estas simplificações seriam mais um passo no processo de transformação digital dos serviços da administração pública, tão almejado pelo governo, reduzindo as deslocações presenciais aos balcões de atendimento do SEF, permitindo assim uma maximização na alocação dos (já reduzidos) recursos e evitando assim uma potencial propagação e disseminação do agora presente vírus COVID-19.
Ainda mais premente, é a clarificação de como e quando o SEF irá dar resposta aos inúmeros processos que se encontram pendentes (em especial as deslocações presenciais balcões do SEF que se encontravam agendadas para Março até ao presente para entrega do processo documental) em virtude do fecho do atendimento presencial por consequência da pandemia COVID-19, bem como informar os requerentes/investidores acerca de quando irão abrir vagas para novos agendamentos e para os que foram adiados.
P: Muito se tem falado sobre as restrições ao Golden Visa no investimento imobiliário em Lisboa e no Porto. Qual o futuro do Golden Visa nestas regiões? Em face da situação de Pandemia e crise económica essas restrições continuam a fazer sentido?
João Ribeiro Pereira: Para se ter ideia do real impacto de uma possível limitação do investimento do Golden Visa, na modalidade de aquisição de ativos imobiliários, nas regiões de Lisboa e Porto, é necessário, em primeiro lugar, aferir o volume de investimento preconizado nestas localizações. Note-se que desde a criação do programa foram investidos cerca de €4.908.676.856,49 (correspondente a cerca de 90% do valor total investidos por via do ARI) em aquisição de imóveis, sendo que a grande maioria se centra nas regiões de Lisboa e Porto. Ora, atendendo à crise pandémica e económica que atualmente se vive, e considerando que essas medidas têm repercussões em diversos setores de atividade conexos, (e.g. promotores, empreiteiros, arquitetos, engenheiros gestores de projeto, consultores, mediadores, advogados, notários, etc.), as medidas de restrição e fomento à “deslocalização do investimento imobiliário” devem, para já, “ficar na gaveta”. Com efeito, não cabendo aqui sindicar a bondade da motivação subjacente às pretendidas alterações, designadamente no que respeita à coesão social e tentativa de travar a tendencial “escalada de preços”, sobretudo no mercado residencial dos grandes centros urbanos, deve imperar o bom senso, reconhecendo-se que o setor imobiliário constitui um forte motor da recuperação económica, à semelhança do que sucedeu na anterior crise do subprime e das dívidas soberanas. Importa ainda salientar que a diminuição drástica do valor de investimento estrangeiro no mercado imobiliário, por via do programa Golden Visa, também terá impacto direto na arrecadação de receita fiscal do Estado e Câmaras Municipais, que vêm reduzidas as contribuições/pagamentos de impostos sobre o rendimento (IRS e IRC, ao nível das mais-valias) e impostos sobre o património (IMT, IMI, AIMI, IS) e demais taxas. Fazendo um breve balanço aos números do ano transato, foram concedidos 946 ARI’s, por via do investimento em imóveis de valor igual ou superior a €500.000,00, correspondendo a um valor total de investimento a rondar os €585.000.000,00. Só a receita fiscal direta oriunda apenas do pagamento de IMT e IS, por referência ao referido montante, ascendeu a €42.000.000,00!
Por outro lado, esta tentativa de “reorientação forçada” do investimento para o interior do país, poderá passar a mensagem (errada) para o exterior de que Portugal já não precisa de investimento estrangeiro e acabará por afastar os investidores para outras jurisdições com programas de residência/investimento idênticos, como é o caso dos outros 17 Estados-Membros que operam regimes similares, com destaque para o Chipre, Malta, Espanha, Grécia, Bulgária, etc.
Por fim, devemos promover a seguinte reflexão coletiva: Será que o mercado interno tem capacidade para absorver todo o produto residencial que tem vindo a ser desenvolvido nos últimos anos e que foi projectado, na sua grande maioria, para o mercado internacional? Em caso negativo, não estaremos a pôr em causa a solvabilidade de centenas de promotores, empreiteiros e demais sectores de atividade conexos, com a inerente subida de desemprego e agravamento do nosso já deficitário sistema de segurança social?
Entrevista Vida Judiciária – Restrições ao Golden Visa no Investimento Imobiliário, respostas de João Ribeiro Pereira, Advogado Associado na RSA.
Leia a entrevista à equipa de Direito Imobiliário e Veículos de Investimento na integra e os restantes artigos da RSA descarregando a revista Vida Judiciária nº 216 (Setembro/Outubro 2020).
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