
Clarificação do regime da propriedade horizontal
Clarificação do regime da propriedade horizontal
No passado dia 10 de Janeiro de 2022, veio a ser publicada a Lei 8/2022 a qual procedeu a uma revisão do Regime da Propriedade Horizontal, alterando o Código Civil, o Decreto-Lei n.º 268/94, de 25 de Outubro e, ainda, o Código de Notariado, na sequência da qual, foram implementadas uma série de alterações, que vêm dar resposta a questões que ao longo dos anos têm vindo a ser debatidas nos Tribunais Portugueses, originando diferentes posições doutrinárias e jurisprudenciais.
Uma das medidas ora adotadas veio clarificar, a responsabilidade pelas dividas do condomínio. Efectivamente, até à presente alteração legislativa, vinha consagrado no artigo 1424.º do Código Civil, que “salvo disposição em contrário, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do Edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum são pagas pelos condóminos em proporção do valor das suas frações.” E a polémica que gerava à volta da interpretação deste preceito legal, consistia em apurar se o novo proprietário seria ou não, também o responsável pelas dividas de condomínio vencidas até à data da alienação da fração.
Tal dúvida prendia-se com o facto de, considerando que as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do Edifício constituem uma obrigação propter rem, inerente ao direito de propriedade, existiam posições doutrinárias e jurisprudências a defender que a obrigação de as pagar acompanha o imóvel, transferindo-se as mesmas ao novo proprietário, ainda que se tenham vencido antes da alienação.
Acontece que, esta discussão deixa de ter razão de ser, isto porque, com a nova redação do artigo 1424.º Código Civil, introduzida pela Lei 8/2022, passa a estar assente que, salvo disposição em contrário, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do Edifício e relativas ao pagamento de serviços de interesse comum são da responsabilidade dos condóminos proprietários da fração no momento das respetivas deliberações, protegendo-se, desta forma, o futuro condómino.
Deste modo, tendo em consideração a protecção do futuro adquirente, bem como, o princípio da transparência e da responsabilização pelo pagamento de eventuais dividas de condomínio, passou a ser exigido que no momento da celebração do contrato de alienação da fração de que é proprietário, seja requerido ao Administrador do Condominio, a emissão de declaração escrita, onde conste o montante de todos os encargos de condomínio em vigor relativos à sua fração, com especificação da sua natureza, montantes e prazos de pagamento, bem como, caso se verifique, das dividas existentes, a sua natureza, montantes, datas de constituição e seu vencimento. Por outro lado, recai sob o administrador a obrigação de emitir tal declaração no prazo máximo de 10 dias, a qual passa a constituir um documento instrutório obrigatório para a celebração da escritura ou documento particular autenticado de alienação da fração em causa. Efectivamente, o nº 3 do artigo 1424.º A que veio a ser aditado ao Código Civil, veio expressamente determinar que “A responsabilidade pelas dividas existentes é aferida em função do momento em que a mesma deveria ter sido liquidada, salvo se o adquirente expressamente declarar, na escritura e/ ou documento particular autenticado que titula a alienação da fração, que prescinde da declaração do administrador, aceitando, em consequência a responsabilidade por qualquer divida do vendedor ao condomínio.”.
Ou seja, caso o adquirente venha a declarar, no documento de alienação, que prescinde da declaração do administrador, aceita, em consequência, a responsabilidade pelo pagamento de qualquer divida respeitante do vendedor ao condomínio. contraídas antes da aquisição.
Esta alteração legislativa, conduziu ainda a uma alteração ao Código do Notariado, passando no seu artigo 54.º a mencionar a exigência de tal declaração.
Deste modo, conseguiu o legislador resolver de uma vez por todas, a dificuldade que era muitas vezes sentida na altura de propor uma ação destinada à cobrança de dividas de condomínio vencidas, quando, entretanto, havia sido a fração alienada. Porquanto surgia a questão de se intentar a correspondente ação judicial contra o anterior proprietário (condómino, à data de vencimento da divida) ou contra o novo proprietário, defendendo assim a posição que a obrigação de pagar acompanha o imóvel nas respetivas transmissões.
Ainda, na esteira das dividas de condomínio, o diploma em análise, veio a reforçar os poderes e responsabilidades do administrador de condomínio, o qual, entre outras, passa a ter como função instaurar a ação destinada à cobrança das quantias em divida pelos Condóminos, no prazo de 90 dias a contar da data do primeiro incumprimento do condómino, salvo deliberação em contrário da assembleia de condóminos e, desde que, o valor em divida seja igual ao valor indexante os apoios sociais do respetivo ano civil.
Finalmente, foi ainda introduzida uma importante alteração, que se espera venha de igual modo a dar por encerrada uma já antiga discussão jurídica, que se prende com as regras respeitantes à legitimidade processual passiva e ativa. De facto, o n.º 1 do artigo 1437.º na sua nova redação, veio expressamente determinar que: “O Condomínio é sempre representado em juízo pelo seu administrador, devendo demandar e ser demandado em nome daquele.”, enquanto que, na sua anterior redação constava apenas “O administrador tem legitimidade para agir em Juízo …” . De resto, tal medida era de tal modo premente, que teve aplicação imediata, ao contrário das demais alterações, que apenas entraram em vigor, 90 dias após a publicação da Lei 8/2022 de 10 de Janeiro.
A Lei 8/2022, para além das alterações acima elencadas, veio ainda a introduzir uma série de importantes e necessárias adaptações, que visam aproximar, o regime aplicável à propriedade horizontal, à realidade dos novos tempos, confirmando algumas das “novidades” introduzidas, o que de resto já vinha sendo praticado nos Condomínios em Portugal.
Ressalvando-se a este respeito algumas das seguintes alterações, actualmente já em vigor: (i) o alargamento / reforço das funções do Administrador do Condomínio, (ii) a possibilidade das assembleias de condomínio, continuarem a ter lugar à distância, caso os seus intervenientes assim o queiram, (iii) e ainda o alargamento do uso dos meios eletrónicos quanto ao envio das convocatórias, ao envio e assinatura das atas.
Clarificação do regime da propriedade horizontal, por Sofia Cardoso.
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