
Alojamento Local: Estudo comparativo entre o Alojamento Local em Portugal e Espanha
Alojamento Local: Estudo comparativo entre o Alojamento Local em Portugal e Espanha
O Acórdão do Pleno das Secções Cíveis do STJ, de 22 de março, veio uniformizar a jurisprudência relativamente à aplicação de algumas normas do Alojamento Local, em Portugal.
O Acórdão foi aprovado por unanimidade e aplica-se a todo o Alojamento Local, mesmo ao que já foi autorizado anteriormente relativamente à existência de alojamento local em edifícios destinados unicamente à habitação, nomeadamente em regime de propriedade horizontal, colocando-se algumas questões sobre os direitos e garantias dos cidadãos.
No referido Acórdão, lê-se que, “no regime da propriedade horizontal, a indicação no título constitutivo de que certa fração se destina a habitação deve ser interpretada no sentido de nela não ser permitida a realização de alojamento local“.
É, assim, trazida à luz do dia uma discussão que, se vem adensando relativamente aos direitos dos proprietários de imóveis que pretendem com o alojamento local obter um lucro emergente de uma atividade inserida na atividade turística e outros proprietários que defendem o direito ao descanso, à tranquilidade e à segurança das suas residências em primeiro lugar.
E não é só em Portugal que tal discussão tem lugar.
Em outubro de 2021, a conclusão de um inquérito elaborado dentro do Espaço Europeu através do Eurobarómetro (centro de sondagens de opinião pública da União Europeia, responsável pela recolha de dados desde 1973) sobre o arrendamento de curta duração revelou que, este tipo de alojamento “contribui para melhorar a atratividade da oferta de serviços turísticos na UE, mas é necessário ter em conta os impactos no conjunto das comunidades”.
Realizado em todos os países europeus, tal inquérito revelou que “25% dos europeus reservam alojamentos de curta duração através de plataformas em linha e que uma grande maioria (89%) dos que já efetuaram essas reservas considera que se trata de uma experiência positiva que recomendaria a outras pessoas”.
“Por outro lado”, acrescentou-se, “a rápida ascensão destes serviços pode ter um impacto para além do ecossistema do turismo, sendo que quase metade das pessoas inquiridas considera que o arrendamento de curta duração provoca um aumento dos incómodos causados pelos turistas, como o ruído, os congestionamentos e os resíduos, bem como preços mais elevados e pressões sobre a disponibilidade de habitação”.
Apesar do aumento do turismo ter suscitado a necessidade de renovação dos centros históricos e o melhoramento de muitas zonas das principais cidades portuguesas, a verdade é que o mesmo trouxe também uma “fuga” dos moradores de certas zonas históricas para dar lugar a estabelecimentos de Alojamento Local.
Para dar resposta a este fenómeno, a Câmara Municipal de Lisboa, por exemplo, criou o Regulamento Municipal de Alojamento Local, que permite aos órgãos municipais limitar a autorização de novas licenças de AL através da criação de zonas de contenção em bairros específicos.
O objetivo é combater a proliferação excessiva de novos estabelecimentos turísticos em bairros onde o alojamento local tem um peso excessivo em relação à residência total disponível, sendo consideradas zonas de contenção todas aquelas que ultrapassem os 25% da habitação disponível afeta ao Alojamento Local. Existem para alem das zonas de contenção, as denominadas zonas de suspensão temporária para áreas entre os 10% e os 20% de habitações ligadas a esta atividade.
No entanto, é possível requerer novas Licenças de AL nas zonas de contenção, as quais se encontram dividas em zonas de contenção absolutas e zonas de contenção relativas, desde que, ligadas a operações de reabilitação de edifícios em ruínas ou reabilitação integral de edifícios devolutos ou ainda de operações que digam respeito à totalidade de um edifício que seja declarado devoluto há mais de três anos ou tenha sido objeto de obras de reabilitação, que tenham tido lugar nos dois últimos anos, dando assim oportunidade a que se reabilitem edifícios deixados ao abandono.
Olhando para o nosso concorrente mais próximo, igualmente com taxas de ocupação turísticas bastante elevadas, verificamos que, também em Espanha, os municípios implementaram novas regras por forma a combater o excesso de licenças para alojamento local.
Entretanto, tal como o Município de Lisboa, também o Município de Madrid implementou várias medidas para controlar o alojamento local, pois à semelhança de Portugal, a proliferação do alojamento local, promovido pelas plataformas digitais em Espanha, exigiu a regulação desta de forma mais intensiva.
Em 2014 (através do Decreto 79/2014 de 10 de Julho) tinham ficado definidas duas formas de alojamento local turístico em Espanha: os apartamento turísticos e as vivendas de uso turístico (VUT).
Ambas as formas de alojamento precisavam de ser regulamentadas por forma a controlar o excesso de oferta e impedir a concorrência desleal com a hotelaria.
Assim, relativamente aos apartamentos turísticos, os quais se podem equiparar à modalidade de “Estabelecimento de Hospedagem” da legislação portuguesa, passou a ser exigido para os de classificação mais elevada, a existência de atendimento permanente e um serviço de restauração.
Já para as VUT (vivendas de uso turístico) passou a ser exigido apenas que, a propriedade se encontrasse mobilada e equipada, com um número de contato visível e que dispusesse de ligação wi-fi.
Em 2019, o Governo veio regularizar a situação jurídica do alojamento local em Espanha, estabelecendo um maior número de condições em relação ao regime anterior.
Passou a ser obrigatório a obtenção de um certificado de idoneidade, ou seja, um documento técnico que assegura que, o imóvel tem aquecimento e água fria e quente, que tem ventilação apropriada e normas de segurança, bem como livro de reclamações, seguro de responsabilidade civil e comunicação às forças de segurança da identidade dos hóspedes, para além da capacidade permitida ser definida em função dos metros quadrados úteis do imóvel.
A Lei Espanhola passou a atribuir ainda autoridade aos condomínios para bloquearem a implantação de alojamentos turísticos nos edifícios, através de uma maioria de 3/5 dos condóminos.
À semelhança das zonas de contenção definidas em Portugal, em Espanha existem também zonas de delimitação, os chamados “anéis concêntricos”, tendo inviabilizado em determinadas zonas o alojamento turístico em cerca de 95%.
Em Espanha, o Município de Madrid é o que apresenta mais semelhanças com Portugal quanto à regulamentação do alojamento local.
A evolução do alojamento local suscitou em ambos os territórios a necessidade de rever a respetiva legislação e ambos procederam ao incremento da regulação através da imposição de um maior número de requisitos, como por exemplo, seguro, livro de reclamações, normas de segurança, etc.
Também foi reforçado o poder dos condóminos, principalmente em Madrid onde estes podem proibir a implementação de alojamentos turísticos no seu edifício.
Em Portugal é conferida a possibilidade do poder local de limitar os novos registos nas áreas que seja considerado necessário, como por exemplo já o fizeram Porto e Lisboa e com o Acórdão do STJ passa agora a haver um reforço para impedir que em prédios destinados a habitação, constituídos em regime de propriedade horizontal seja possível o licenciamento das respectivas frações para alojamento local.
No caso de Madrid, a disputa de competências entre o poder local e regional dificulta a retirada de conclusões, mas o plano proposto é uma quase total proibição para uma grande parte da cidade.
A tendência é proteger o direito ao descanso, à tranquilidade e à segurança dos titulares do direito de propriedade sobre frações autónomas de prédios constituídos em regime de propriedade horizontal em detrimento do exercício de uma atividade inserida na atividade turística que permita acesso ao lucro emergente dessa mesma atividade.
Alojamento Local: Estudo comparativo entre o Alojamento Local em Portugal e Espanha, por Paula Xabregas.
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