
As alterações ao regime legal do Alojamento Local

O alojamento local (AL) tem o seu regime legal consagrado no Decreto Lei n.º 128/2014, de 29 de agosto, tendo sofrido algumas alterações, a última das quais introduzida pela Lei n.º 56/2023, de 6 de outubro (a comunmente designada Lei do Mais Habitação). É sobre as alterações introduzidas por este último diploma que nos vamos centrar, pelas alterações e limitações que vem acarretar para a atividade de AL.
Por um lado, temos, desde logo, a suspensão de novos registos de AL, para as modalidades de apartamentos e estabelecimentos de hospedagem (entre os quais se incluem os hostels) integrados numa fração autónoma de edifício em todo o país, com exceção dos territórios de interior e das Regiões autónomas. Ou seja, na prática a restrição aplica-se aos municípios situados na zona litoral e na região do Algarve, salvaguardando os 165 municípios classificados como de baixa densidade e 73 freguesias de baixa densidade também, ainda que localizadas em municípios de alta densidade populacional.
E mesmo nas zonas em que sejam admitidos novos registos, os mesmos passam a ser emitidos pelo prazo de 5 anos. Este prazo é passível de renovação, a qual carece de deliberação expressa da respetiva Câmara Municipal, no prazo que para o efeito estiver definido em Regulamento Municipal. Ficam, assim, as dúvidas quanto ao período de antecedência com que deve ser efetuado esse pedido de renovação, em que medida não existirão desigualdades de município para município e em que termos é emitida a decisão de renovação, uma vez que nas alterações introduzidas nada é referido quanto a estes pontos.
No que respeita aos títulos já emitidos e existentes à data da entrada em vigor destas alterações, que até agora não tinham prazo e apenas cessavam por cancelamento (oficioso ou a pedido do titular), as mesmas serão todas revistas em 2030 e passarão a ter, também estas, uma validade de 5 anos, e sujeitas a similar processo de renovação.
Ainda no que respeita a esses títulos, passa a existir também a obrigação de fazer prova, por via de apresentação de declaração contributiva, da efetiva existência da atividade de exploração do alojamento local, sob pena de cancelamento dos registos por decisão do presidente da câmara municipal respetiva. Esta prova deve ser feita no prazo de 2 meses a contar da entrada em vigor da suprarreferida Lei, ou seja, até 7 de dezembro de 2023. Depreende-se que a mesma seja feita por via do Balcão do Empreendedor, o qual, no entanto, não parece estar ainda preparado para esse procedimento adicional, embora o prazo já esteja em curso.
De realçar também que passa a vigorar o princípio da intransmissibilidade do título de Alojamento Local, sendo que no caso de pessoas coletivas a caducidade ocorre mesmo quando apenas se verifique transmissão de qualquer parte do capital social, independentemente da percentagem.
Outra das medidas a destacar, é o reforço da posição da Assembleia de condóminos no que respeita ao funcionamento de um AL em fração autónoma de prédio constituído em propriedade horizontal (PH). Embora a Assembleia já dispusesse de alguns poderes ao nível da oposição à instalação e/ou funcionamento do AL, nomeadamente no que se referia a hostels ou oposição devidamente fundamentada ao funcionamento do AL, com estas alterações basta existir, por deliberação de pelo menos 2/3 da permilagem do edifício, uma oposição à instalação do AL, sem necessidade de qualquer fundamentação, deliberação essa comunicada ao Presidente da respetiva Câmara Municipal, produzindo efeitos 60 dias após a mesma. Este mecanismo impede o exercício de um direito básico do titular da exploração de AL: o de ser previamente ouvido face à tomada de decisão, uma vez que, embora esteja prevista a comunicação da deliberação à CM, esta não se pronuncia nem valida, mas fica, no entanto, sujeita à emissão obrigatória de um ato administrativo de cancelamento do respetivo registo de AL. Estão excecionados desta situação os casos em que no próprio título constitutivo da PH se preveja a utilização da fração para fins de AL ou caso haja uma deliberação expressa da assembleia de condóminos a autorizar esse AL.
Já no âmbito das medidas com direto impacto financeiro, temos a criação da CEAL – Contribuição Extraordinária sobre o Alojamento Local e o agravamento do IMI.
Em termos de IMI para efeitos de liquidação, o coeficiente de vetustez a considerar para imóveis com registo de alojamento local será sempre de 1.
Já em termos de CEAL, esta contribuição adicional passa a ser aplicada a apartamentos e estabelecimentos de hospedagem integrados numa fração autónoma de edifício, salvo os que se encontrem em zonas de baixa densidade. Os imóveis que não constituam frações autónomas, nem partes ou divisões suscetíveis de utilização independente não estão abrangidos, sendo o caso do AL na modalidade de moradia, por exemplo.
Estão isentos desta taxa também as unidades de alojamento local em habitação própria e permanente, desde que a exploração não ultrapasse 120 dias por ano.
Esta isenção significa, por exemplo que um Residente Não Habitual (RNH), que tem a sua habitação própria em Portugal e decida colocar a sua casa em AL por alguns meses fica isento de CEAL; mas o mesmo já não sucede se um residente tiver uma casa, por exemplo, numa zona de praia e resolver ter a mesma em AL nos meses de verão apenas.
Esta taxa será de 15%, é anual e deverá ser paga até ao dia 25 de junho do ano seguinte.
Para determinar o valor a pagar são tidos em conta vários critérios, ainda que em nenhum deles seja levado em linha de conta o efetivo rendimento gerado pelo AL em causa: coeficiente económico (rendimento médio anual por quarto apurado pelo INE e área bruta mínima de um T1, nos termos do RGEU) e coeficiente de pressão urbanística (variação entre as rendas de referências por m2).
Esta Contribuição, poderá suscitar várias questões, nomeadamente ao nível da própria constitucionalidade e do incumprimento do princípio da capacidade contributiva. Trata-se de uma contribuição que, na realidade, se configura quase como um imposto, mas que está a incidir sobre rendimento presumido e não sobre um rendimento real. Não parece verificar-se a necessária uniformidade, ou seja, tratar de modo igual os contribuintes que se encontrem em situações iguais e de modo diferente aqueles que se encontrem em situações diferentes, na medida da diferença, a aferir pela capacidade contributiva.
Por último, mas também não menos relevante, temos a previsão da responsabilidade solidária no pagamento da CEAL por parte do proprietário do imóvel com o titular efetivo da exploração do AL. Mais uma vez se poderá suscitar a constitucionalidade desta norma, pela total ausência de qualquer capacidade contributiva neste caso. O que está previsto é uma possível substituição de um sujeito passivo da contribuição por outro, sem que este tenha qualquer relação com a atividade em causa, ou seja, temos previsto o pagamento de dividas tributárias por terceiros, sem que esse terceiro possa fazer o que seja para justificar a inexistência de fundamento para esse pagamento.
As alterações ao regime legal do Alojamento Local, por Sandra Neves.
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