
MAIS HABITAÇÃO – Celeridade dos Despejos – Ilusão ou Realidade?

MAIS HABITAÇÃO – Celeridade dos Despejos – Ilusão ou Realidade?
O que muda com o Balcão do Arrendatário e Senhorio (BAS) e com a alteração ao Procedimento Especial de Despejo (PED)?
O Programa “Mais Habitação” apresentado pelo Governo em 16 de Fevereiro de 2023, tinha como principal objectivo minimizar os efeitos da crise habitacional que vêm assolando o País, através de um conjunto de medidas que, por um lado, visavam aumentar a oferta de imóveis para fins habitacionais e combater a especulação imobiliária através de limitações ao valor das rendas nos novos contratos de arrendamento e, por outro lado, reforçar a confiança dos proprietários no mercado de arrendamento.
Com vista a prosseguir tal objectivo, o Programa “Mais Habitação”, veio avançar com 3 (três) medidas essenciais, nomeadamente:
(i) Criação do “Programa Arrendar para Subarrendar” (DL nº 38/2023, de 29 de Maio), através do qual, é conferida a faculdade ao IHRU em proceder ao arrendamento de imóveis destinados á habitação, por um período de 5 (cinco) anos, com vista a, posteriormente, subarrendar essas mesmas casas a preços acessíveis. Ou seja, desta forma, o IHRU, compromete-se a pagar uma renda aos proprietários, com vista a que os mesmos possam usufruir de rendimento mensal estável, á margem de quaisquer incumprimentos, com a garantia de que os imóveis locados serão entregues em condições idênticas às recebidas, além de, ainda, poderem vir a auferir de determinados benefícios fiscais;
(ii) Em caso de incumprimento dos contratos de arrendamento para habitação por falta de pagamento de rendas, que se vençam após o prazo da oposição, o Estado passa a substituir-se ao arrendatário e irá assumir o pagamento de um valor máximo mensal correspondente a 1,5 vezes a Remuneração Mínima Mensal Garantida, com o limite total de nove vezes a Remuneração Mínima Mensal Garantida. Contudo, para que, o senhorio venha a auferir de tal pagamento, é necessário que, o arrendatário ainda se mantenha a ocupar o locado e o senhorio tenha requerido cumulativamente com o pedido de despejo, o pagamento das rendas, encargos ou despesas em atraso.
(iii) Criação do Balcão do Arrendatário e do Senhorio (BAS) em substituição do Balcão Nacional do Arrendamento (BNA), ao qual caberá assegurar a tramitação do Procedimento Especial de Despejo (PED) e do Serviço de Injunção em Matéria de Arrendamento (SIMA), tendo como objectivo a simplificação do seu funcionamento e, ainda, o reforço das garantias dos senhorios e arrendatários.
De facto, volvidos vários anos sobre a criação e instalação do BNA, o qual pretendia constituir uma resposta á morosidade dos tribunais, não poderá deixar de se reconhecer que, em termos de celeridade e eficácia, os seus objectivos não foram alcançados. Efectivamente, nos casos em que, o arrendatário deduza oposição, ou qualquer outra pretensão que determine a remessa do processo para o Tribunal, os proprietários poderão ter de aguardar cerca de 1 (um) ano até que o locado lhe seja entregue devoluto de pessoas e bens.
No passado dia 06 de julho, foi votada na especialidade a Proposta de Lei nº 71/XV/1º, que prevê a criação do Balcão do Arrendatário e do Senhorio (BAS) e, ainda, vem introduzir várias alterações ao Procedimento Especial de Despejo (PED).
As principais alterações introduzidas ao referido Procedimento Especial de Despejo, com vista a ser alcançar a tão expectável celeridade na execução dos despejos e, simultaneamente, assegurar aos arrendatários uma alternativa ao realojamento, foram as seguintes:
(i) Admissibilidade em recorrer ao procedimento especial de despejo quando se tenha frustrado a comunicação ao arrendatário;
(ii) Á notificação dos arrendatários passam a ser aplicadas as regras previstas nos artigos 231º, 232º, 237º, 238º e 246º do CPC, ou seja, frustrando-se a via postal, doravante, passará a ser possível proceder á notificação por agente de execução ou funcionário judicial, bem como por mandatário judicial e, mais concretamente, no que respeita às pessoas colectivas, passarão a aplicar-se as regras previstas no art. 246º do CPC;
(iii) Quando não haja oposição ao despejo, ou, se considere a mesma como não deduzida, e, ainda, quando o arrendatário não proceda á desocupação do locado, nem ao pagamento ou depósito das rendas que se venceram na pendência do procedimento especial de despejo, o processo será concluso ao juiz, a fim de ser proferida decisão judicial para entrada imediata no domicílio, devendo, a mesma ser concretizada de imediato;
(iv) Por outro lado, quando a oposição seja julgada improcedente, o juiz condena o arrendatário a proceder entregar o imóvel no prazo de 30 (trinta) dias, valendo tal decisão como autorização de entrada imediata no domicílio, sem prejuízo de as partes poderem acordar um prazo diferente para a entrega do locado.
(v) Caso os serviços de segurança social que acompanham o procedimento de
despejo, venham a concluir no relatório a apresentar sobre a situação social do arrendatário que o mesmo se encontra numa situação de especial fragilidade por falta de alternativa habitacional ou outra razão social imperiosa, tais circunstâncias constituem motivo excepcional para ser decretada a suspensão do processo de despejo.
Ora, sem prejuízo de consideramos que as alterações preconizadas ao Procedimento Especial de Despejo (PEC) tiveram como objectivo ultrapassar alguns obstáculos à tramitação do referido processo e, simultaneamente, colmatar determinadas lacunas, a verdade é que, com toda a probabilidade, as mesmas serão manifestamente insuficientes para alcançar o objectivo pretendido e, por conseguinte, para satisfazer as legitimas expectativas de ambas as partes.
Efectivamente, no âmbito desta matéria, não estamos a colocar em causa, quer a necessária protecção da defesa dos arrendatários, quer a protecção dos legítimos interesses dos senhorios, isto porque, ambas as partes detêm ao seu alcance os mecanismos jurídicos necessários para fazer valer os seus direitos, estamos, isso sim, a questionar a eficácia dos referidos mecanismos e das alterações ora propostas.
De facto, se tivermos em consideração a posição dos arrendatários (não podemos deixar de referir que, a maior parte dos procedimentos especiais de despejos está directamente relacionada com a falta de pagamento de rendas e com a não entrega do locado, na sequência da oposição à renovação dos contratos de arrendamento por parte do senhorio), certamente, as medidas ora preconizadas – sub-rogação do Estado nos direitos do senhorio em relação às rendas liquidadas, os quais poderão ser exercidos através de execução fiscal e definição de um determinado prazo para proceder à entrega do locado – não vão de encontro às suas legitimas expectativas,
expectativas essas que, estão direcionadas para o encontro de uma solução alternativa para o seu realojamento, com a maior brevidade possível.
E, se atentarmos aos legítimos interesses dos senhorios, certamente, o seu principal objectivo, não consistirá em ser ressarcido do valor correspondente às rendas, ou, a uma determinada percentagem das mesmas (tanto mais que, dispõe dos meios judiciais necessários para obter a cobrança coerciva dos referidos montantes quer perante o arrendatário, quer perante o fiador), mas si, em recuperar o imóvel locado, com a maior rapidez possível, a fim de voltar a colocá-lo no mercado de arrendamento.
Efectivamente, não podemos deixar de referir que, quer o actual BNA, quer o futuro
BAS, apenas tem competência, para executar e tornar efectivo o despejo na sequência da cessação do contrato de arrendamento que já tenha operado extrajudicialmente, ou seja, não detêm competências de natureza judicial, dado que, a sua principal função está relacionada com a constituição de um título para a desocupação do locado.
Porém, tal não significa que, o Procedimento Especial de Despejo (PED) não pudesse ser simplificado, com vista a corresponder á legitima expectativa de todos os intervenientes, contudo, a verdade é que, as alterações ora preconizadas, não foram nesse sentido.
De facto, entre as alterações propostas, não podemos deixar de referir que, é manifestamente incompreensível que, o requerimento de despejo tenha de ser sempre remetido ao tribunal, inclusivamente, nas situações em que não foi deduzida qualquer oposição, a fim de ser proferida decisão judicial para entrada imediata no domicílio. Por outro lado, ao passar a ser conferida ao arrendatário a faculdade de, no prazo para a oposição, deduzir incidente de intervenção principal provocada, tal situação irá retardar ainda mais a normal prossecução do processo.
Acresce que, nos casos em que os serviços da segurança social (que, doravante, passam a acompanhar o procedimento de despejo), venham a concluir que o arrendatário se encontra numa situação de fragilidade por falta de alternativa habitacional ou outra razão social imperiosa, sendo decretada a suspensão do processo de despejo, quanto tempo irá demorar até ser encontrada uma alternativa para a realojamento do arrendatário e para o senhorio obter a desocupação do locado?
Sendo assim, em face destas contingências, não podemos deixar de concluir que, com toda a probabilidade, as medidas ora adoptadas, poderão vir a traduzir-se numa mera ilusão, isto porque, não só, não irão conferir uma maior protecção aos arrendatários, como também, não reforçam a confiança dos investidores com todas as consequências daí advenientes, nomeadamente, ao nível da redução da oferta de imóveis no mercado para arrendamento.
MAIS HABITAÇÃO – Celeridade dos Despejos – Ilusão ou Realidade?, por Carla Freire.

Para quando a (eficiente) reforma da justiça administrativa e fiscal?

Para quando a (eficiente) reforma da justiça administrativa e fiscal?
A Assembleia da República aprovou, recentemente, a Lei n.º 34/2023, de 19 de Julho que concede ao Governo autorização legislativa para revisão dos seguintes diplomas legais:
- a) Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, aprovado em anexo à Lei n.º 13/2002, de 19 de Fevereiro;
- b) Código de Procedimento e de Processo Tributário, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 433/99, de 26 de Outubro;
- c) Regime Geral das Infrações Tributárias, aprovado em anexo à Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho;
- d) Decreto-Lei n.º 42/2001, de 9 de Fevereiro, que cria as secções de processo executivo do sistema de solidariedade e segurança social, define as regras especiais daquele processo e adequa a organização e a competência dos tribunais administrativos e tributários.
A referida autorização legislativa tem a duração de 180 dias para o Governo, finalmente, promover a muito anunciada e sempre adiada reforma da justiça administrativa e fiscal, através da alteração de alguns dos seus diplomas estruturantes, de modo a corresponder às exigências urgentes dos diversos operadores judiciários e, em especial, dos cidadãos que continuam a sofrer as consequências da sua morosidade.
Importa recordar que, desde o dia 10 de Janeiro de 2023, data da abertura do ano judicial, a Senhora Ministra da Justiça vem anunciando a realização de trabalhos legislativos para o Governo concretizar a “Reforma da Justiça Administrativa”, o que até à presente data culminou na publicação apenas de dois diplomas legais.
Por um lado, o Decreto-Lei n.º 30/2023, de 5 de Maio, que estabelece um regime excepcional e temporário de incentivo à extinção da instância em processos que corram termos nos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal.
Este diploma prevê que, em certas circunstâncias e até 14 de Setembro de 2026, os processos têm uma redução de 25% no pagamento de taxas de justiça. No entanto, esta medida terá uma aplicação residual para as entidades administrativas e para o Ministério Público porquanto estão vinculados ao princípio da legalidade, o que inviabilizará a promoção da extinção da instância através dos mecanismos aí previstos (confissão, desistência e transacção).
Por outro lado, o Decreto-Lei n.º 31/2023, de 5 de Maio, que consagra a autonomia administrativa e financeira do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais e define a sua estrutura orgânica e regulação dos respetivos serviços. Trata-se do reflexo do estado da justiça administrativa e fiscal que, apenas em 2023 e decorridos quase 40 anos desde a sua criação, se dote o respectivo conselho superior dos meios e organização necessários ao exercício pleno das suas competências aguardando-se a sua concretização para, finalmente, dotar os tribunais das ferramentas e recursos para assegurar a tutela jurisdicional efectiva dos cidadãos.
Das várias medidas abrangidas pelo sentido e extensão da referida autorização legislativa destacamos as seguintes:
1 – A harmonização das regras de formação dos colectivos de julgamento com as alterações efetuadas pela Lei n.º 56/2021, de 16 de Agosto, que introduz mecanismos de controlo da distribuição electrónica dos processos da jurisdição administrativa e fiscal. A este propósito, torna-se relevante avaliar se, neste âmbito, se verificarão algumas das dificuldades operativas e de gestão de recursos sentidas na jurisdição comum na aplicação do controlo da distribuição electrónica dos processos.
2 – A criação do Tribunal Central Administrativo Centro, com sede em Castelo Branco. Apesar das dúvidas que poderão ser suscitadas sobre os critérios de escolha de Castelo Branco em deterimento de outras capitais de distrito na zona centro do país onde também estão sedeados Tribunais Administrativos e Fiscais (Viseu, Coimbra e Leiria), importará definir com clareza e rigor orçamental os termos desta medida, uma vez que poderá ser necessário proceder à construção de um novo edifício para instalação deste tribunal ou, em alternativa, alocarem-se imóveis já existentes para o efeito.
3 – A criaçao das subsecções administrativa comum, administrativa social e de contratos públicos e as subsecções tributária comum, de execução fiscal e de recursos contraordenacionais nos tribunais centrais administrativos, o que constitui uma medida benéfica para desbloquear a indesejada morosidade decisória nesta instância e que muito tem contribuído para o descrédito da justiça administrativa e fiscal, bem como para a desistência ab initio pelos cidadãos na defesa dos seus direitos perante estes tribunais.
No cruzamento das iniciativas legislativas desta temática emerge a dúvida sobre se é possível compatibilizar a gestão adequada pretendida pelo Governo dos recursos associados à jurisdição administrativa e fiscal com as legítimas expectivas dos cidadãos para obterem decisões em prazo razoável através das quais o acesso e o direito à justiça se concretizem de forma eficiente nos tribunais administrativos e fiscais.
Para quando a (eficiente) reforma da justiça administrativa e fiscal?, por André Batoca.

As novas regras para os vistos Gold, versão 2023

As novas regras para os vistos Gold, versão 2023
Volvidas que estão várias semanas, desde que o Governo anunciou de forma prematura o fim total dos “vistos gold” ou em vocabulário legislativo, o fim das chamadas autorizações de residência para investimento (as “ARI”), temos assistido a diversos movimentos cíveis e partidários para alterar e fazer “recuar” a intenção governativa nesse campo.
Chegados aqui, cumpre apreciar que os partidos portugueses aprovaram um pacote de medidas incluídas no âmbito do plano de intervenção governamental “Mais Habitação”, e dessas medidas resultaram algumas alterações legislativas ao diploma que regula as ARI, em concreto a Lei n.º 23/2007 de 04.07 na sua redação atual (“o regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional”).
Em concreto, as ARI não terminam em absoluto e serão possíveis de ser concedidas em casos muito específicos, o que revela que a ação cívica e partidária teve os seus efeitos junto da esfera governativa que insistia em terminar de vez com os vistos gold/ ARI.
Resulta das alterações a serem implementadas que serão revogadas as possibilidades de obter as ARI nas seguintes atividades de investimento, a saber: (i) as transferências de capitais no montante igual ou superior a 1,5 milhões de euros; (ii) a aquisição de bens imóveis de valor igual ou superior a 500.000,00 euros; e (iii) a aquisição de bens imóveis, cuja construção tenha sido concluída há, pelo menos, 30 anos ou localizados em área de reabilitação urbana e a realização de obrar de reabilitação dos bens imóveis adquiridos, no montante global igual ou superior a 350.000,00 euros.
Ou seja, sobre estas atividades de investimento e desde a data da entrada em vigor da lei aprovada, que não serão mais admitidos novos pedidos de ARI. No entanto, não serão prejudicadas as renovações de ARIs (e respetivos reagrupamentos familiares se aplicáveis) quando essas autorizações tenham sido concedidas até à entrada em vigor da nova lei.
Tal possibilidade de renovação será também atribuída àqueles imigrantes que tendo uma autorização de residência pretendam converter a sua autorização em autorização de residência para imigrantes empreendedores.
Relativamente aos pedidos pendentes de concessão e renovação na data de entrada em vigor da nova lei e que se encontrem a aguardar decisão junto das entidades competentes, estes manter-se-ão válidos, inclusive esta regra será válida para os pedidos que se encontrem pendentes de procedimentos prévios juntos das Câmaras Municipais.
Em concreto, a nova lei irá retirar apenas duas das atividades de investimento possíveis, e que foram a duas principais fontes de investimento da qual resultaram a maioria da concessão das ARIs, ou seja, a aquisição de imóveis novos ou a reabilitação por valores previamente definidos e em zonas devidamente identificadas e a transferência de capitais para conta bancária sediada em território nacional também em valores a rondar os 1.5 milhões de euros.
Assim, as atividades de investimento que conduzam, em regra, à concretização de, pelo menos, uma das seguintes situações em território nacional e por um período mínimo de 5 anos, serão elegíveis para a obtenção de ARI, a saber:
- A transferência de capitais no montante igual ou superior a 500.000,00 euros, destinados à aquisição de partes de organismos de investimento coletivo não imobiliário, que sejam constituídos ao abrigo da legislação portuguesa, cuja maturidade, no momento do investimento, seja de, pelo menos, 5 anos e, pelo menos, 60% do valor dos investimentos seja concretizado em sociedades comerciais sediadas em território nacional.
- A transferência de capitais no montante igual ou superior a 500.000,00 euros, destinados à constituição de uma sociedade comercial com sede em território nacional, conjugada com criação de 5 postos de trabalho permanentes, ou para reforço de capital social de uma sociedade comercial com sede em território nacional, já constituída, com a criação de pelo menos 5 postos de trabalho permanentes ou manutenção de pelo menos 10 postos de trabalho, com um mínimo de 5 permanentes, e por um período mínimo de 3 anos.
- O investimento no valor igual ou superior a 500.000,00 euros que seja aplicado em atividades de investigação de entidades públicas ou privadas que integrem o sistema científico e tecnológico nacional
- O investimento em valor igual ou superior a 250.000,00 euros que seja aplicado no apoio à produção artística ou na recuperação ou manutenção do património cultural nacional, através de serviços da administração direta central e periférica, institutos públicos, entidades que integram o setor publico empresarial, fundações publicas, fundações privadas com estatuto de utilidade publica, entidades intermunicipais, entidades que integram o setor empresarial local, entidades associativas municipais e associações publicas culturais, que prossigam atribuições na área da produção artística, recuperação ou manutenção do património cultural nacional.
- Criação de, pelo menos, 10 postos de trabalho.
Os valores referentes à criação de postos de trabalho e os investimentos científicos e culturais não se podem destinar, direta ou indiretamente, ao investimento imobiliário e podem ser inferiores em 20% quando a atividade seja efetuada em territórios de baixa densidade. Para avaliar o seu impacto na atividade científica, cultural e na promoção de investimento direto estrangeiro e criação de postos de trabalho, estas atividades carecem de avaliação a cada 2 anos.
Estas são em suma as alterações que as ARIs/ visto gold irão sofrer e apesar de se afastar os investimentos imobiliários para promover o pacote Mais Habitação, não deixa de ser importante a manutenção das atividades de investimento ora referidas de modo a atrair investimento estrangeiro em áreas e setores onde se encontram mais carências no território nacional.
As novas regras para os vistos Gold, versão 2023, por Pedro Gonçalves Paes.

Mais Habitação e o Xeque-Mate ao Alojamento Local

Mais Habitação e o Xeque-Mate ao Alojamento Local
No dia 06 de julho, começou a ser votada na especialidade a Proposta de Lei nº 71/XV/1º, sendo que, no que respeita ao regime do alojamento local, não restam dúvidas de que, as medidas aprovadas consubstanciam um verdadeiro “xeque-mate” a este setor.
De facto, atendendo às alterações já anteriormente aprovadas, bem como, à clara e evidente intenção do Governo em colocar no mercado de arrendamento imóveis que possam ser afetos ao arrendamento habitacional, era perfeitamente expectável, qual a finalidade que se pretendia alcançar com a aprovação de tais medidas.
E, a verdade é que, tal objetivo começou a ser delineado com a aprovação da Lei n.º 62/2018 a qual veio a proceder a profundas alterações ao DL n.º 128/2014 de 29 de Agosto e no âmbito da qual foram aprovadas as seguintes restrições ao regime do Alojamento Local:
- No caso de a atividade de alojamento local ser exercida numa fração autónoma do edifício ou em parte de prédio urbano suscetível de utilização independente, a assembleia de condóminos, por deliberação fundamentada de condóminos que representem mais de metade da permilagem do edifício, pode opor-se ao exercício de tal atividade, quando estejam em causa atos que perturbem a normal utilização do prédio, e afetem o descanso dos condóminos, devendo, para o efeito, dar conhecimento da respetiva decisão ao Presidente da Câmara Municipal territorialmente competente (art. 9.º n.º 2);
- Proibição da instalação de “hostels”, em prédios constituídos em regime de propriedade horizontal, nos prédios em que coexista habitação, sem autorização dos condóminos (art. 4.º n.º 4).
Assim, de acordo com a restrição prevista no art. 9.º n.º 2 do DL nº 128/2014, de 29 de Agosto, sempre que estivesse em causa, o normal funcionamento do condomínio, ou, a prática de atos que afetassem o descanso dos condóminos, em assembleia de condóminos, por deliberação correspondente a mais de metade da permilagem do edifício, passou a ser conferida aos condóminos a faculdade de se oporem ao exercício de tal atividade, mediante decisão devidamente fundamentada.
No entanto, importa desde já referir que, esta faculdade que foi conferida aos condóminos está diretamente relacionada com o normal funcionamento do condomínio, não estando, por conseguinte, em causa, a exigência de qualquer autorização para o exercício da atividade de alojamento local.
Por outro lado, o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 4/2002 de 22/03/2022 (Proc. nº Ac. 24471/16.4T8PRT.P1.S2-A), ao decidir, no sentido de que “no regime de propriedade horizontal, a indicação no título constitutivo, de que certa fracção se destina a habitação, deve ser interpretada no sentido de nela não ser permitida a realização de alojamento local”, veio consubstanciar uma clara limitação ao exercício de tal atividade.
Efetivamente, o referido Acórdão, considera que as alterações que foram preconizadas pelo DL n.º 128/2014 de 29 de Agosto não contemplam a tutela dos condóminos nos casos em que ocorra um uso da fração autónoma diverso do destino que lhe é dado pelo estatuto condominial ou violação de proibições condominiais.
Ora, apesar de tal Acórdão não consubstanciar uma decisão vinculativa e, por conseguinte, não ter efeito sobre a legislação em vigor, a verdade é que, veio a refletir-se nas decisões que os tribunais vieram a proferir, quer nas ações que se encontravam pendentes, quer nas ações que posteriormente vieram a ser instauradas.
Acresce que, ao ser proferida tal decisão, qualquer condómino poderia arguir esta ilicitude e exigir judicialmente a cessação desta atividade, independentemente, de o proprietário ter procedido ao registo de estabelecimento de alojamento local e de ter obtido o título de abertura ao público.
Isto é, a qualquer condómino de fração autónoma de prédio constituído em regime de propriedade horizontal, assistia a faculdade de instaurar as ações judiciais necessárias, com vista a reagir contra a violação das limitações ao exercício do direito de outro condómino, nos termos e ao abrigo do disposto nas alíneas c) e d) do n.º 2 do art. 1422.º do Código Civil, bem como, ao abrigo da tutela geral da propriedade constante do art. 1346.º do Código Civil.
Presentemente, no dia 06 de Julho, foram votadas na especialidade, novas regras do alojamento local, de acordo com a Proposta de Lei nº 71/XV/1º, no âmbito do programa Mais Habitação.
A verdade é que, as alterações aprovadas consubstanciam evidentes dificuldades à afetação de imóveis à atividade de alojamento local quando inseridos em prédios em regime de propriedade horizontal.
Será que o enfraquecimento deste setor vai efetivamente alcançar o objetivo de incrementar o número de fogos disponíveis para o arrendamento urbano? Só o tempo o dirá, mas a verdade é que os proprietários das frações afetas à atividade do alojamento local, poderão sempre optar por dar um outro fim aos referidos imóveis.
Porém, dúvidas não podem subsistir de que, com a aprovação de tais alterações, não só, o exercício da tal atividade em frações autónomas inseridas em prédios urbanos destinados a habitação (estas restrições não se aplicam a moradias, prédios totalmente destinados ao alojamento local e imóveis destinados a fins não habitacionais) está gravemente comprometida, como também, com toda probabilidade, irá assistir-se a um aumento da litigiosidade.
Com manifesta relevância para a atividade do alojamento local, no passado dia 06 de julho, foram aprovadas em sede de especialidade, as seguintes medidas:
- Os novos registos de alojamento local em prédios destinados à habitação vão passar a depender de uma autorização prévia do condomínio – art. 1419.º do Código Civil;
- O cancelamento de um registo que já existe passa a ter de ser aprovado por 2/3 da permilagem do edifício quando atualmente é de metade. Para o cancelamento se concretizar, a Assembleia de Condóminos tem de comunicar a deliberação ao Presidente da Câmara Municipal do local, produzindo efeitos no prazo de 60 (sessenta) dias após o envio da deliberação e só poderá haver reabertura do alojamento local mediante deliberação em contrário da assembleia de condóminos.
- Quotização extraordinária para o alojamento local de 15%.
Por outro lado, não podemos deixar de referir que, certamente, como forma de mitigar os prejuízos que irão ser causados aos proprietários das frações autónomas afetas ao alojamento local, foi aprovada a isenção dos rendimentos prediais obtidos em sede de IRS e IRC, até 31 de dezembro de 2029, desde que, se verifiquem os seguintes requisitos cumulativos:
- Transferência para o mercado de arrendamento habitacional de imóveis afetos à atividade de alojamento local;
- Que o registo do alojamento tenha sido concretizado até 31 de dezembro de 2022;
- Que os contratos de arrendamento sejam celebrados até 31 de dezembro de 2024.
Finalmente, consideramos que, com as medidas ora aprovadas, certamente, irá verificar-se um aumento da litigiosidade diretamente relacionado quer com as relações condominiais, quer com as impugnações das deliberações das assembleias de condóminos, isto porque, deverá ocorrer um especial dever de cuidado por parte do administrador de condomínio na convocação das respetivas assembleias de condomínios, na verificação de que se encontram reunidos os pressupostos para a sua realização e, ainda, nas comunicações a efetuar aos condóminos ausentes.
Mais Habitação e o Xeque-Mate ao Alojamento Local, por Joana Madureira.

O Compliance inteligente começa nas empresas

O Compliance inteligente começa nas empresas
Longe vão os tempos em que as teias societárias/grupos empresariais podiam ser entendidas como lugar de opacidade desejável, necessária para apagar, ou pelo menos dificultar, os passos da investigação criminal – são hoje entendidas como uma parte fundamental na instalação de uma cultura de transparência, de aplicação jurídica consciente e sustentável e de uma verdadeira cultura de compliance.
O quadro de responsabilidades de empresas e dirigentes, ainda numa abordagem geral, é, no entanto, dinâmico e evolutivo – é necessário conhecer, a todo e a cada tempo, aquilo que é o conjunto de redes legais aplicáveis que devem concertar o concreto desenvolvimento da vida societária de uma dada empresa.
De facto, as situações, os quadros e as redes em que pode surgir a responsabilidade dessas mesmas empresas tem vindo a aumentar, nomeadamente através daquilo que são alterações profundas no regime de responsabilidade das pessoas colectivas, propugnado pela Lei 94/2021. Às responsabilidades tradicionais dos dirigentes (responsabilidade societária; responsabilidade fiscal; responsabilidade por dívidas aos trabalhadores e violação do RGPD; qualificação da insolvência; crimes falimentares), surgem, agora, outros vectores normativos que exigem uma resposta musculada – ao nível da implementação de programas de compliance por parte das entidades do Regime Geral de Prevenção da Corrupção (Decreto-Lei 109-E/2021), da Lei de Prevenção de Branqueamento de Capitais (58/2020), da Lei de Whistleblowing (Lei 93/2021), entre outras.
E esta questão torna-se mais premente quando a lei prevê que pode ser considerada a circunstância de a pessoa coletiva ter adotado e executado, depois da comissão da infração e até à data da audiência de julgamento, um programa de cumprimento normativo com medidas de controlo e vigilância idóneas para prevenir crimes da mesma natureza ou para diminuir significativamente o risco da sua ocorrência (Cfr. artigo 90.º-B do Código Penal).
Quais são, então, as vantagens efectivas de um programa robusto de compliance?
1 – Prevenção de incumprimentos: estipular um programa de compliance e conformidade, elaborado sob medida, com a identificação dos riscos reais e adaptado às características específicas de uma dada entidade, permitirá evitar aquilo que poderão ser violações e/ou incumprimentos das obrigações estipuladas na maior parte das redes legais supra mencionadas. Quando falamos nestas violações não podemos deixar de sublinhar que o custo real potencial inclui, obviamente, o conjunto de coimas e outras sanções acessórias previstas no âmbito daqueles redes legais (que, por exemplo, no âmbito da lei de prevenção de branqueamento de capitias podem chegar aos cinco milhões de euros para as entidades obrigadas), mas inclui também um conjunto de outros custos, num perímetro de consideração mais alargado, que têm que ser considerados pelas entidades: custos com as investigações internas, custos com os legal fee’s de representação e defesa legal das empresas, e, aqui muito importante, aquilo que podem ser consequências negativas pesadas ao nível da imagem e reconhecimento de uma determinada sociedade. Falamos dos efeitos colaterais que podem passar pelo enfraquecimento do perfil de crédito, rating e liquidez dessas entidades e que podem ir, dependendo do âmbito de actividade de determinada empresa, até à exclusão de procedimentos e contratos públicos.
Em todos estes campos, um programa de compliance pode desempenhar o seu papel: prevenindo os potenciais incumprimentos – de forma presente e dinâmica – permitindo um crescimento jurídico sustentado da empresa.
2 – Vantagem competitiva: ao assumir o seu compromisso sustentável com um programa de compliance alargado, um sociedade pode fidelizar clientes, investidores, fornecedores e outras partes interessadas eticamente (captação de stakeholders) na prossecução sustentável do negócio. Tudo o que são as consequências negativas do incumprimento de uma das obrigações das redes legais mencionadas (ordens de suspensão temporária das actividades, coimas, entre outras) podem ser mitigadas e prevenidas por esta preocupação de implementação de um programa de conformidade – assumindo-se um compromisso com uma visão societária mas estável e duradoura, numa óptica de gestão constante do risco.
3 – Exiting investments: existe uma preocupação transversal, por parte dos investidores, com as questões relacionadas com fraude, corrupção e outros potenciais quadros de ilícitos criminais de cariz económico (num aumento claro da sensibilidade com este temas/preocupações de cariz penal económico), pelo que um programa de compliance adaptado às exigências das empresas, pode funcionar como uma garantia complementar/adicional aos investidores, de forma a mitigar as preocupações existentes sobre eventuais casos de responsabilidade legal, transmitindo uma posição de segurança (e força) que faz com que as exigências de garantias (ou protecção indemnizatórias) diminuam. Desta forma, a possibilidade de desistência em quadros de investimento acaba, também, por ser menor.
4 – Detecção prévia de problemas: um programa de compliance eficaz pode oferecer às várias sociedades a possibilidade de detectar desconformidades no cumprimento das obrigações legais, antes de qualquer investigação pelas autoridades competentes, permitindo a tomada de mediadas proactivas na superação das fragilidades identificadas.
5 – Penalty mitigation: a importância de implementação de um programa de compliance passa também pela adopção de uma postura de cumprimento, que possibilita uma via de diálogo mais directa e profícua com as entidades de investigação, podendo potenciar – como se viu supra a propósito do artigo 90.º-B do Código Penal e mesmo em caso de eventual incumprimento – uma redução da putativa coima a aplicar.
Para que haja um reconhecimento externo da efectividade e compromisso com a aplicação de programas de compliance, é também necessária que as entidades possam exercitar um programa de cumprimento que permita a detecçao de comportamentos indevidos, no âmbito da legislação supra referida; e, assente na construção da cultura de compliance como parte integrante da entidade, para que haja um encorajamento de comportamento ético efectivo na sociedade que se projecte externamente e potencie as sinergias de construção de uma imagem compliant.
Para tal, a preocupação de implementação de programas de compliance não pode estar limitada a círculos de baixa amplitude: isto é, sendo apenas uma preocupação do inhouse lawyer, do responsável pelo cumprimento normativo ou mesmo do compliance officer.
O desafio de eficácia tem que ser mais amplo, jurídico e estruturado. Precisa do envolvimento estrutural da sociedade, assente em formação constante e aprofundada, envolvendo os elementos do Conselho de Administração (que têm, até, no âmbito de algumas dessas redes – como no regime de prevenção de branqueamento de capitais – uma função de supervisão expressa), exigindo os mais altos níveis de conformidade como uma marca de adn (compromisso) da própria sociedade.
O Compliance inteligente começa nas empresas, por João Luz Soares.

Legal Alert Moçambique – Aprovada a Nova Lei de Investimento em Moçambique
Versão bilingue
Legal Alert Mozambique – New Investment Law Approved in Mozambique

Construção de Habitação em Solo Rústico: Combate à dispersão ou promoção da desertificação?

Construção de Habitação em Solo Rústico: Combate à dispersão ou promoção da desertificação?
A construção em solo rústico apenas pode ser realizada a título excecional, o que constitui medida necessária e adequada a impedir a indesejável dispersão territorial.
No entanto, as necessidades habitacionais e dinâmicas no mundo rural são substancialmente diferentes daquelas que sucedem na cidade.
Perante isto, impõe-se encontrar o equilíbrio.
Se, por um lado, o regime aplicável não pode ser permissivo sob pena de resultar em indesejável alastramento da ocupação dispersa do território, por outro lado, das restrições aplicáveis não deve resultar o desincentivo à instalação de novas famílias e ocupação do interior e do mundo rural em geral.
A lei de bases gerais da política pública de solos, de ordenamento do território e de urbanismo (Lei 31/2014, de 30/5) veio prever que a classificação do solo se dividia entre solo rústico e solo urbano.
O solo rústico consiste naquele que, pela sua reconhecida aptidão, se destine, nomeadamente, ao aproveitamento agrícola, pecuário, florestal, à conservação, valorização e exploração de recursos naturais, de recursos geológicos ou de recursos energéticos, assim como o que se destina a espaços naturais.
Contrapõe-se assim ao solo urbano, ou seja, o que está total ou parcialmente urbanizado ou edificado e, como tal, afeto em plano territorial à urbanização ou à edificação.
A edificação em solo rústico só pode ser admitida pelos planos territoriais de âmbito intermunicipal ou municipal como excecional e limitada aos usos e ações compatíveis com os respetivos critérios de classificação e qualificação.
Sem prejuízo da referida excecionalidade da construção de habitação em solo rústico, os Municípios, nos planos que aprovam, costumam usar a unidade mínima de cultura para a definição de condições de edificabilidade em prédios rústicos, sendo frequente prever-se a possibilidade de construção de moradia unifamiliar em solo rústico em terreno com área superior à unidade de cultura.
Outras exceções são expressamente previstas no regime da Reserva Agrícola Nacional (RAN), no que concerne à construção de habitação para residência própria e permanente de agricultores em exploração agrícola ou quando os respetivos proprietários e respetivos agregados familiares se encontrem em situação de comprovada insuficiência económica e não sejam proprietários de qualquer outro edifício ou fração para fins habitacionais.
Das exceções acima mencionadas não nos parece resultar o equilíbrio entre aquelas que são as necessidades habitacionais do mundo rural e as restrições à indesejável dispersão territorial, parecendo-nos que estas últimas são desproporcionalmente protegidas sobre as primeiras.
Essa desproporção resulta clara das alterações promovidas à fixação da unidade de cultura para cada zona do país, as quais se mantiveram inalteradas desde 1970 até à publicação da Portaria n.º 219/2016, de 9/6, a qual veio aumentar as unidades de cultura em todas as zonas do país, chegando estas a atingir mais do sêxtuplo do que se previa na Portaria 202/70.
O legislador, desconsiderando em absoluto os avanços na ciência agrónoma optou por aumentar exponencialmente as dimensões da unidade de cultura, parecendo-nos que o estado atual da técnica permitirá a utilização produtiva de parcelas de dimensão inferior – e não superior – ao que sucedia em 1970, obtendo-se rentabilidade económico-financeira em parcelas de menor dimensão, como sucede com a agricultura hidropónica.
Sob a égide de um pretenso combate à existência de parcelas de pequena dimensão das quais não se logra obter rentabilidade económico-financeira, impede-se a instalação de novas famílias e fixação das populações no interior, quando é certo que o desenvolvimento tecnológico permite obter rentabilidade de explorações rurais de menor dimensão do que aquela que resulta da unidade de cultura em vigor.
A tese da rentabilidade económico-financeira tem de se expressar em critérios económicos e financeiros – passe o pleonasmo -, senão existirão restrições ao direito da propriedade sem fundamento, violando a Constituição (art.º 62.º da CRP).
A não previsão de exceções adequadas à construção de habitação adequada à exploração agrícola, partindo do conceito de exploração económico-financeira adequada ao invés de um arcaico sistema baseado em dimensão mínima, afasta o legislador de objetivos sempre anunciados, como sejam: (i.) a fixação de populações no mundo rural; (ii.) o combate à desertificação; (iii.) a prevenção de incêndios florestais; (iv) o combate às alterações climáticas, etc..
As restrições atualmente existentes conduzem ainda à precaridade das condições em que residem emigrantes contratados para trabalho rural, originando desnecessária pressão urbanística sobre as povoações mais próximas aos locais de trabalho daqueles trabalhadores.
Foi recentemente anunciada proposta de alteração legislativa para simplificação do procedimento de reclassificação do solo rústico para urbano quando o destino seja a instalação de atividades de natureza industrial ou logística, bem como para aumentar a disponibilidade de habitação a custos controlados.
A referida proposta continua sem resolver a habitação no espaço rural, antes pretendendo utilizar o solo rústico para resolver problemas da urbe, como sucede com a falta de oferta habitacional geral. É preciso ir mais longe nesta matéria.
Para que se logre o necessário equilíbrio entre medidas restritivas à dispersão da ocupação do território e o combate à desertificação, há que prever mais exceções à construção de habitação em solo rústico, permitindo a fixação daqueles que trabalhem e/ou pretendam trabalhar no mundo rural obterem as necessárias condições de habitação próximas da respetiva exploração agrícola.
Não o fazendo, o legislador não está a combater a dispersão da ocupação do território, antes a promover a desertificação do mesmo
Construção de Habitação em Solo Rústico: Combate à dispersão ou promoção da desertificação?, por Rui Moreira de Resende.

Legal Alert – Moçambique Implementa Reformas para Aprimorar o Ambiente de Negócios e a Transparência nas Licitações Públicas
Versão bilingue
Legal Alert – Mozambique Implements Reforms to Enhance Business Environment and Transparency in Public Procurement

Como reagir aos resultados do “check-up” empresarial

Como reagir aos resultados do “check-up” empresarial
Após a análise pelo órgão de gestão do relatório de avaliação da empresa (diagnóstico via check-up), que identifique fragilidades relevantes não conhecidas ou ainda não objecto de intervenção correctiva, terá de ser desenvolvida uma estratégia de actuação em que a vertente jurídica é indispensável.
Existem procedimentos a respeitar e prazos que não podem ser ultrapassados, sendo de realçar a convocatória obrigatória dos órgãos de fiscalização e, nas situações mais complexas, da assembleia geral para que os membros do órgão de gestão fiquem habilitados a tomar determinadas decisões.
Existem fragilidades típicas, sempre mencionadas na literatura clássica, a saber:
Entre as deficiências que mais podem afetar o desempenho da empresa estão factores relacionados à formação e talento do pessoal que a integra, planeamento estratégico inadequado, problemas de produção e tecnologia que levam à obsolescência da empresa, processos inadequados em toda a sua actividade e, em especial, problemas relacionados com o financiamento da sua actividade, de curto e médio prazo.
Daí que, incidentes relacionados com a insuficiência da tesouraria face aos compromissos assumidos pela empresa, são o último sinal que o órgão de gestão executiva não pode deixar de considerar como da máxima relevância e que impõem uma acção imediata.
As fragilidades (doenças) detectadas no check-up empresarial relacionadas com o financiamento da sua actividade, que não possam ser sanadas por via da intervenção dos sócios (reforço do capital social, prestações suplementares ou suprimentos) ou através de mecanismos de reorganização societária (fusões, aquisições, parcerias comerciais), podem impor o recurso ao mecanismo previsto no artigo 1 do CIRE, que se transcreve:
“- Estando em situação económica difícil, ou em situação de insolvência meramente iminente, a empresa pode requerer ao tribunal a instauração de processo especial de revitalização…”.
Efectivamente, num ciclo de elevadas subidas das taxas de juro e dos efeitos decorrentes do crescente valor da inflação, que altera a previsões e os planos de negócios efectuados sem atender a tais realidades surpreendentes, as empresas endividadas podem ser surpreendidas pela incapacidade de fazer face às obrigações de pagamento de empréstimos, por ruptura da tesouraria.
Embora exista uma obrigação da Administração negociar com os credores, para alcançar a indispensável reestruturação dos créditos, nem sempre o tempo disponível é suficiente para evitar um incumprimento contratual definitivo e afastar as consequências para a empresa.
O processo especial de revitalização de empresas, num contexto de mercados instáveis, pode ser uma medida de recuperação preventiva para as empresas economicamente viáveis, que se encontram numa situação económica difícil ou de insolvência iminente, garantindo as condições necessárias para que, mantendo a sua actividade regular, usufruam de um período de negociação equitativo com os respetivos credores, sem que os mesmos possam invocar incumprimentos contratuais (obrigatoriedade de suspensão das iniciativas coercivas) e fiquem sujeitos ao dever de colaboração e de actuação de boa-fé.
Acreditamos que, não sendo possível a reestruturação de créditos financeiros num ambiente extrajudicial, o recurso ao PER moldado pelas novas regras de votação de planos de revitalização, em que é viável, em determinadas circunstâncias, aprovar um plano contra a vontade de credores dominantes, pode ser um caminho a trilhar num ciclo de crise dos mercados e aumento das dificuldades de acesso ao crédito bancário.
No próximo ciclo de crise financeira, as empresas devem estar preparadas para reagir aos resultados dos meios de diagnóstico empresarial, através de equipa de dimensão multidisciplinar, mas sem esquecer que, como refere o Prof. José Gonçalves Machado, existem novidades:
“A Lei n.º 9/2022, de 11 de janeiro, procurando ser obediente à Diretiva (UE) 2019/1023, transpôs para o ordenamento jurídico português o regime “cross-class cram-down” que se traduz por “reestruturação forçada da dívida contra categorias de credores”. Trata-se de um importante mecanismo de homologação de planos de recuperação não consensuais (não aprovados por todas as categorias).”
Importa conhecer a estatística (antecedentes) para acreditar nas soluções a adoptar no futuro: no período entre 2012 e 2019, num total de 2.387 empresas que recorreram ao PER e tiveram plano homologado, a taxa de sucesso do PER foi de 55,5%, traduzindo os casos que após o encerramento do processo PER com homologação de plano não voltaram a ter necessidade de se apresentar a este instrumento ou à insolvência, sendo de destacar a conclusão do resumo executivo do Relatório de Avaliação do PER (DGPJ, 8 de julho de 2020, pág.2):
“Esta taxa é demonstrativa da aderência do PER à realidade, mas deixa ainda espaço para se intervir, designadamente, na melhoria de mecanismos de early warning que se mostrem efetivos e que permitam às empresas chegarem a este processo cada vez mais cedo, logo que os problemas de tesouraria comecem a fazer sentir-se.”
Como reagir aos resultados do “check-up” empresarial, por António Raposo Subtil.

A obrigação dos administradores promoverem o “check-up empresarial”

A obrigação dos administradores promoverem o “check-up empresarial”
Antes de outras considerações, importa esclarecer que, nos termos do artigo 6 (noções de administradores e representantes legais) do CIRE (código da insolvência e recuperação de empresas), são qualificados como administradores “aqueles a quem incumba a administração (gestão) da pessoa colectiva”, mas, para efeitos da qualificação da insolvência como culposa, o conceito é ampliado prevendo a atribuição da responsabilidade a todos os que “administrem de direito ou de facto a empresa”.
Por força da previsão do artigo 11 do Código Penal, entende-se que “ocupam uma posição de liderança os órgãos e representantes da pessoa colectiva e quem nela tiver autoridade para exercer o controlo da sua actividade, incluindo os membros não executivos do órgão de administração e os membros do órgão de fiscalização.”
No artigo 74 do CSC (código das sociedades comerciais) são apresentados os deveres fundamentais dos gerentes e administradores da sociedade, que a doutrina resume como “a obrigação de actuarem com a diligência de um gestor criterioso e ordenado e com lealdade, no interesse da sociedade, tendo em conta os interesses dos sócios e dos trabalhadores”.
O âmbito da responsabilidade dos dirigentes das empresas (denominados por administradores, líderes ou gestores), em qualquer das vertentes (insolvência, penal e civil), é muito amplo e tem na base um conjunto de deveres gerais e específicos, assim como um quadro sancionatório muito relevante.
Parece fácil concluir que, numa dimensão preventiva, a inexistência do oportuno “check-up empresarial”, que permita identificar uma situação económica difícil ou de insolvência iminente, poderá arrastar os gestores ou líderes (gerentes ou administradores de direito ou de facto) para o julgamento como responsáveis pela eventual insolvência, ilícitos criminais ou indemnização pelos danos causados a trabalhares ou sócios da empresa.
Igualmente parece razoável defender que, existindo uma obrigação de negociar com credores da empresa a reestruturação de créditos, para evitar incumprimentos irreversíveis, se não existir o pertinente relatório, após o “check-up empresarial”, os administradores da empresa não actuaram com a normal diligência e no cumprimento dos seus deveres fundamentais.
Não se trata especificamente da eventual violação do dever de apresentação atempada da empresa à insolvência, que poderá ter relevância em sede da qualificação da insolvência, mas da violação do CSC, que prevê que os administradores, gerentes e directores são também civilmente responsáveis para com os sócios e terceiros pelos danos que directamente lhes causem no exercício das suas funções.
A promoção pelos administradores, com a periodicidade adequada, de “check-up” à empresa de que são responsáveis, à semelhança do que ocorre com as pessoas singulares, constitui o cumprimento de um dever fundamental, que não sendo respeitado poderá ter consequências graves.
O Professor José Gonçalves Machado, a propósito dos instrumentos pré-insolvenciais de recuperação de empresas e na apresentação da sua tese de doutoramento afirma que:
“Na pré-insolvência, os gestores devam reorientar a sua conduta, principalmente, para a recuperação preventiva das empresas, o que assenta, por um lado, no interesse público em evitar a liquidação e o encerramento desnecessários de empresas viáveis e, por outro lado, na necessidade de encontrar soluções razoáveis e justas que satisfaçam melhor os interesses dos credores, sócios, trabalhadores e outros interessados, face aquilo que normalmente os processos de insolvência ou de liquidação oferecem. Em consequência, os gestores devem tomar as medidas necessárias e adequadas para evitar a insolvência, o que se traduz, fundamentalmente, no respeito pela obrigação geral de não praticar qualquer conduta que ameace a viabilidade da empresa pré-insolvente e no cumprimento de um dever especial de promover a negociação de um acordo no âmbito dos instrumentos pré-insolvenciais de recuperação de empresas. Este dever especial existe se o plano de recuperação for necessário, adequado, razoável e justo, isto é, se evidenciar que a empresa pré-insolvente é ainda suscetível de recuperação, que satisfaz o teste do melhor interesse das partes afetadas e discordantes, e que assegura que estas são tratadas, pelo menos, tão favoravelmente quanto quaisquer outras da mesma categoria e mais favoravelmente do que quaisquer outras de categoria inferior.”
A obrigação dos administradores promoverem o “check-up empresarial”, por António Raposo Subtil.