
A obrigação dos administradores promoverem o “check-up empresarial”

A obrigação dos administradores promoverem o “check-up empresarial”
Antes de outras considerações, importa esclarecer que, nos termos do artigo 6 (noções de administradores e representantes legais) do CIRE (código da insolvência e recuperação de empresas), são qualificados como administradores “aqueles a quem incumba a administração (gestão) da pessoa colectiva”, mas, para efeitos da qualificação da insolvência como culposa, o conceito é ampliado prevendo a atribuição da responsabilidade a todos os que “administrem de direito ou de facto a empresa”.
Por força da previsão do artigo 11 do Código Penal, entende-se que “ocupam uma posição de liderança os órgãos e representantes da pessoa colectiva e quem nela tiver autoridade para exercer o controlo da sua actividade, incluindo os membros não executivos do órgão de administração e os membros do órgão de fiscalização.”
No artigo 74 do CSC (código das sociedades comerciais) são apresentados os deveres fundamentais dos gerentes e administradores da sociedade, que a doutrina resume como “a obrigação de actuarem com a diligência de um gestor criterioso e ordenado e com lealdade, no interesse da sociedade, tendo em conta os interesses dos sócios e dos trabalhadores”.
O âmbito da responsabilidade dos dirigentes das empresas (denominados por administradores, líderes ou gestores), em qualquer das vertentes (insolvência, penal e civil), é muito amplo e tem na base um conjunto de deveres gerais e específicos, assim como um quadro sancionatório muito relevante.
Parece fácil concluir que, numa dimensão preventiva, a inexistência do oportuno “check-up empresarial”, que permita identificar uma situação económica difícil ou de insolvência iminente, poderá arrastar os gestores ou líderes (gerentes ou administradores de direito ou de facto) para o julgamento como responsáveis pela eventual insolvência, ilícitos criminais ou indemnização pelos danos causados a trabalhares ou sócios da empresa.
Igualmente parece razoável defender que, existindo uma obrigação de negociar com credores da empresa a reestruturação de créditos, para evitar incumprimentos irreversíveis, se não existir o pertinente relatório, após o “check-up empresarial”, os administradores da empresa não actuaram com a normal diligência e no cumprimento dos seus deveres fundamentais.
Não se trata especificamente da eventual violação do dever de apresentação atempada da empresa à insolvência, que poderá ter relevância em sede da qualificação da insolvência, mas da violação do CSC, que prevê que os administradores, gerentes e directores são também civilmente responsáveis para com os sócios e terceiros pelos danos que directamente lhes causem no exercício das suas funções.
A promoção pelos administradores, com a periodicidade adequada, de “check-up” à empresa de que são responsáveis, à semelhança do que ocorre com as pessoas singulares, constitui o cumprimento de um dever fundamental, que não sendo respeitado poderá ter consequências graves.
O Professor José Gonçalves Machado, a propósito dos instrumentos pré-insolvenciais de recuperação de empresas e na apresentação da sua tese de doutoramento afirma que:
“Na pré-insolvência, os gestores devam reorientar a sua conduta, principalmente, para a recuperação preventiva das empresas, o que assenta, por um lado, no interesse público em evitar a liquidação e o encerramento desnecessários de empresas viáveis e, por outro lado, na necessidade de encontrar soluções razoáveis e justas que satisfaçam melhor os interesses dos credores, sócios, trabalhadores e outros interessados, face aquilo que normalmente os processos de insolvência ou de liquidação oferecem. Em consequência, os gestores devem tomar as medidas necessárias e adequadas para evitar a insolvência, o que se traduz, fundamentalmente, no respeito pela obrigação geral de não praticar qualquer conduta que ameace a viabilidade da empresa pré-insolvente e no cumprimento de um dever especial de promover a negociação de um acordo no âmbito dos instrumentos pré-insolvenciais de recuperação de empresas. Este dever especial existe se o plano de recuperação for necessário, adequado, razoável e justo, isto é, se evidenciar que a empresa pré-insolvente é ainda suscetível de recuperação, que satisfaz o teste do melhor interesse das partes afetadas e discordantes, e que assegura que estas são tratadas, pelo menos, tão favoravelmente quanto quaisquer outras da mesma categoria e mais favoravelmente do que quaisquer outras de categoria inferior.”
A obrigação dos administradores promoverem o “check-up empresarial”, por António Raposo Subtil.

Antena Aberta – Reestruturação forçada de dívida contra categorias de credores
Participe na Antena Aberta RSA sobre “reestruturação forçada de dívida contra categorias de credores”, no quadro da Diretiva (UE) 2019/1023, que estabelece: regimes de reestruturação preventiva, o perdão de dívidas e as medidas destinadas a aumentar a eficiência dos processos relativos à reestruturação, à insolvência e ao perdão de dívidas.

A terapia após o “check-up empresarial”!

A terapia após o “check-up empresarial”!
O “check-up empresarial” enquanto instrumento de gestão, para além da função preventiva, permite ajustar o planeamento estratégico da empresa identificando os seus pontos fortes e fracos, assim como as oportunidades e ameaças, em especial no seu setor de atividade.
Os sintomas relativos a fragilidades no desenvolvimento da empresa, de curto prazo, após a identificação das causas, que necessariamente têm de constar do relatório de diagnóstico (check-up), podem ter uma dimensão, por regra, económica, financeira e/ou organizacional, que impõem as terapias (intervenções) adequadas.
Como tem sido declarado, a realização de um diagnóstico empresarial, permite ao líder (promotor, empresário, gestor), um conhecimento da situação real da organização num contexto atualizado sem filtros, que permite (e impõe) medidas corretivas, visando reduzir ou anular os problemas detetados, para tornar a organização menos vulnerável perante fornecedores e, em especial, financiadores.
No plano de ação a desenvolver pela empresa para cumprir os objetivos constantes da avaliação da empresa, que identifique as causas, por exemplo, de incumprimentos contratuais (ou a sua inevitabilidade), devem ser mencionadas (também avaliadas) as contingências no patamar das responsabilidades dos seus dirigentes, nomeadamente ao nível dos prazos para recorrer a um dos procedimentos previstos no CIRE (código da insolvência e recuperação de empresas) e em legislação avulsa (RERE – regime especial de recuperação de empresas).
Importa realçar que, em face da recente alteração ao artigo 11 do código penal (responsabilidade penal), as pessoas com “uma posição de liderança são subsidiariamente responsáveis pelo pagamento de multas e indemnizações em que a pessoa coletiva ou entidade equiparada for condenada”, entendendo-se que “ocupam uma posição de liderança quem nela tiver autoridade para exercer o controlo da sua atividade, incluindo os membros não executivos do órgão de administração e os membros do órgão de fiscalização”.
Igualmente devemos reconhecer que os critérios e prazos em vigor, para “os dirigentes das empresas” fazerem uso dos procedimentos extrajudiciais e judiciais previstos na lei, são muito restritivos e que, sendo desrespeitados, numa situação de insolvência da empresa os poderá envolver no incidente de qualificação da insolvência como culposa, que permite sancionar a sua negligência com: inibições, perda de créditos, indemnizações, etc.
Por imposição legal, as empresas têm o dever de se apresentar à insolvência dentro dos 30 dias seguintes à data em que ocorreu a situação de insolvência, sendo que o conhecimento (dos factos relevantes que podem ser detetados no check-up) se presume de forma inilidível (não admite prova em contrário) passados três meses da verificação do incumprimento generalizado de contratos ou obrigações tipificadas no CIRE.
O caminho preventivo e gradual na procura (diagnóstico) e resolução (terapia) de algumas fragilidades (doenças) das empresas segue a lógica apresentada no nosso Guia RRR (aqui): reestruturação, revitalização e recuperação preventiva de empresas.
No final, quer o “check-up empresarial”, quer as medidas corretivas (terapia) visando remover as fragilidades detetadas, têm uma função preventiva e constituem uma oportunidade para reduzir contingências num dupla dimensão: para a pessoa coletiva e para os seus dirigentes.
A terapia após o “check-up empresarial”!, por António Raposo Subtil.

Legal Alert – União dos Mercados de Capitais: Comissão Europeia propõe novas regras para proteger e capacitar os pequenos investidores na UE
No passado dia 24 de maio, a Comissão Europeia adotou um pacote de medidas destinadas aos investimentos de retalho que coloca os interesses dos consumidores no centro deste tipo de investimento.

Quem tem de pagar as despesas de condomínio, no contrato de locação financeira?

Quem tem de pagar as despesas de condomínio, no contrato de locação financeira?
Nos termos do disposto no artigo 1º do Decreto-Lei 149/95, de 24 de junho, com a redação introduzida pelo Decreto-Lei nº 30/2008, de 25 de fevereiro, o contrato de locação financeira é “ o contrato pelo qual uma das partes se obriga, mediante retribuição, a ceder à outra o gozo temporário de uma coisa, móvel ou imóvel, adquirida ou construída por indicação desta, e que o locatário poderá comprar, decorrido o período acordado, por um preço nele determinado ou determinável mediante simples aplicação dos critérios nele fixados.”.
Ao longo dos anos, tem sido muita a jurisprudência e a doutrina que se tem debruçado sobre o tema do locatário e do locador e, sobre os direitos e deveres de cada um deles, nomeadamente, sobre quem tem a obrigação de pagar as despesas de condomínio, no caso de um contrato de locação financeira imobiliária que tenha por objeto uma fração autónoma.
Ora, uma das obrigações do locatário, prevista na al. b) do nº 1 do artigo 10º, do Decreto-Lei 149/95, de 24 de junho, é “pagar, em caso de locação de fração autónoma, as despesas correntes necessárias à fruição das partes comuns de edifício e aos serviços de interesse comum”.
Contudo, importa aferir se tal obrigação apenas vincula as partes no contrato de locação financeira ou se é oponível a terceiros, nomeadamente, ao condomínio.
A jurisprudência e a doutrina não têm sido unânimes sobre tal assunto. Sendo que, existe uma corrente a defender que tal obrigação do locatário apenas é oponível ao locador, ou seja, apenas vigora entre as partes do contrato de locação financeira imobiliário.
Assim, e seguindo tal entendimento, o condomínio não pode, caso não sejam pagas as despesas correntes da fração autónoma objeto do contrato de locação financeira, agir judicialmente contra o locatário.
Tal vertente sustenta que, nos termos do disposto no art. 10º, nº 2, al. e) do Decreto-Lei 149/95, de 24 de junho, o legislador atribuiu ao locador os direitos que, “pela sua natureza”, só ele possa exercer. Tais direitos são aqueles que intrinsecamente se ligam ao estatuto de proprietário. Assim, e seguindo tal raciocínio, todas as despesas necessárias à fruição das partes comuns de edifício e aos serviços de interesse comum que não sejam correntes, previstas no art. 10.º, n.º 1, al. b) do Decreto-Lei 149/95, de 24 de junho, são da responsabilidade do locador.
Conforme dispõe o artigo 1424º, nº 1 do Código Civil, a responsabilidade pelo pagamento dos encargos com despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns de edifício constituído em propriedade horizontal e ao pagamento de serviços de interesse comum desse mesmo edifício é cometida por lei aos condóminos, ou seja, aos proprietários de cada uma das frações autónomas que o constituem.
No caso do contrato da locação financeira, o proprietário do bem é o locador, logo, aplicando apenas o disposto artigo 1424º, nº 1 do Código Civil, seria o responsável pelo pagamento de tais despesas.
Mas, não tem sido esse o entendimento da maioria da jurisprudência em Portugal, pois essa interpretação conduziria a resultados manifestamente desadequados à realidade económica subjacente ao contrato de locação financeira de imóveis, que está na origem da especificidade do respetivo regime jurídico, nomeadamente, ao atribuir ao locatário a responsabilidade pelo pagamento referente às despesas com as partes comuns do edifício em propriedade horizontal.
A génese dos contratos de locação financeira é a atividade de financiamento pelo locador financeiro da aquisição de bens móveis e imóveis pelo locatário, seguindo-se da imediata disponibilização do gozo e fruição desse mesmo bem, de forma temporária e mediante retribuição na perspetiva da futura aquisição desse mesmo bem pelo locatário.
Na verdade, no plano prático, e tendo em vista resolver a responsabilidade de cada uma das partes no contrato de locação financeira, no pagamento das despesas de condomínio, a jurisprudência maioritária tem vindo a entender o locatário como o “proprietário económico ou material” e o locador como “proprietário jurídico ou formal”.
Nessa senda, temos a opção do legislador na redação da al. b) do nº 1 do artigo 10º, do Decreto-Lei 149/95, de 24 de junho, que pretendeu diferenciar o contrato de locação financeira do regime legal próprio da locação em geral e das normas previstas no regime de propriedade horizontal, em matéria de responsabilidade pelo pagamento das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum.
Dessa forma, o disposto na alínea b) do nº 1 do artigo 10º do Decreto-Lei 149/95, de 24 de junho, surge, assim, como norma especial e exceção à regra geral, imposta pelo artigo 1424º do CC, e, assim sendo, impõe-se igualmente a terceiros, incluindo o condomínio.
Em suma, o locatário financeiro surge com uma posição jurídica reforçada em relação ao que seria se fosse considerado apenas o regime geral da locação, recaindo sobre o mesmo a obrigação de pagar, em caso de locação de fração autónoma, as despesas correntes necessárias à fruição das partes comuns de edifício e aos serviços de interesse comum (alínea b) do nº 1 do artº 10º do DL 149/95).
Quem tem de pagar as despesas de condomínio, no contrato de locação financeira?, por Paula Lopes.

A natureza preventiva do “check-up” empresarial

A natureza preventiva do “check-up” empresarial
O conceito de avaliação de uma empresa, num período de vicissitudes surpreendentes, como a crescente subida das taxas de juro, pode ser definida atendendo a diversos níveis de intervenção: “Check-up”, “RX”, “Diagnóstico”, etc.
Como tem sido ensinado, num “RX empresarial” pretende-se encontrar e caracterizar problemas profundos e ocultos, de modo detalhado e envolvendo uma análise integrada de todas as dimensões da atividade, incluindo a financeira, recursos humanos, marketing, etc.
Por sua vez, o termo “diagnóstico” quando aplicado a pessoas coletivas significa que teve lugar uma recolha de informação e avaliação aprofundada e sistemática do nível de desempenho da empresa, visando conhecer as razões (causas e efeitos) das limitações de saúde da empresa, que impõe a imediata adoção de medidas corretivas, normalmente gizadas na respetiva ficha técnica que integra o relatório de diagnóstico.
Numa dimensão técnico-jurídica, a avaliação geral da empresa visando a identificação de sintomas de debilidade económico-financeira, poderá ser designada por “check-up empresarial”, que no nosso “Guia prático de reestruturação, revitalização e recuperação preventiva de empresas” (e-book disponível em www.rsa-lp.com) tem os devidos desenvolvimentos, enquanto processo de análise multidisciplinar da situação da empresa, identificando eventuais fragilidades e/ou contingências, bem como oportunidades a considerar pelos acionistas e gestores.
A natureza preventiva do “check-up empresarial”, resulta do facto da avaliação produzida e vertida no pertinente relatório, após análise da informação (documentação) societária, financeira, laboral e tributária, impor ou aconselhar a intervenção dos sócios ou dos gestores, para efeitos de concretização ou rejeição das medidas preconizadas.
Como acontece com as pessoas físicas, a realização de um “check-up” (due diligence específica) a uma empresa tem, necessariamente, um efeito preventivo, dado que permite avançar para um nível de intervenção mais profundo e/ou adotar medidas imediatas, para evitar desequilíbrios irreversíveis da situação financeira da empresa e, no limite, a sua insolvência.
A liderança da organização do processo documental (societário, financeiro, contabilístico, etc) pelo Advogado da empresa, sem prejuízo de ser indispensável uma avaliação multidisciplinar, tem enormes vantagens, em especial por serem atualmente frequentes debilidades ao nível financeiro, que podem ser controladas ou reduzidas por via de medidas judiciais de interposição imediata.
O agravamento das condições (prazos e juros) dos contratos de financiamentos subscritos por muitas empresas, em conjunto com vicissitudes de mercado negativas, podem precipitar a empresa para uma situação económica difícil ou de insolvência iminente, pelo que o recurso imediato aos mecanismos previstos na lei, protegem a empresa, nomeadamente: o processo especial de revitalização, o processo extraordinário de viabilização e o regime extrajudicial de recuperação.
No entanto, sempre que possível, o reequilíbrio financeiro da empresa pode ser obtido por via de um procedimento de negociação e reestruturação financeira dos contratos de financiamento (alteração de prazos, taxas, garantias) se necessário beneficiando da eficiência fiscal aplicável no âmbito dos processos judiciais supra identificados.
A prevenção ao nível da avaliação da situação económico-financeira da empresa (check-up), que muitas vezes não está presente nas preocupações da gestão das empresas, tem reduzidos custos e enormes vantagens, impedido ou reduzindo intervenções inesperadas dos credores financeiros, para quem a subida das taxas de juro e a inflação crescente, impõem medidas rápidas e, por vezes, supreendentes.
A natureza preventiva do “check-up” empresarial, por António Raposo Subtil.

Ebook – Novo Regime de Gestão de Activos
Documento de apoio à Antena Aberta do próximo dia 30 de maio.

Liquidação judicial de OIC e de sociedades gestoras: as novas regras do RGA

Liquidação judicial de OIC e de sociedades gestoras: as novas regras do RGA
O Decreto-Lei n.º 27/2023, de 28 de Abril, que aprovou o Regime de Gestão de Activos (RGA) ao mesmo anexo e que vigorará a partir do próximo dia 29 de Maio, tem como objetivo simplificar e conferir maior proporcionalidade à regulação do setor da gestão colectiva de ativos, com o objetivo de incrementar a competitividade e o desenvolvimento do mercado, sem prejuízo da tutela dos investidores. O RGA adota um quadro regulatório comum dos OIC, regulando de forma unitária as matérias que estão atualmente dispersas pelo RGOIC e pelo RJCRESIE, por ele revogados, promovendo ainda um alinhamento do direito nacional com o direito da União Europeia.
Em sede de liquidação judicial dos Organismos de Investimento Colectivo (OIC) e das sociedades gestoras, o RGA veio estabelecer um conjunto de normas inovatórias 1, omissas no regime pregresso, sobre o qual ora nos debruçamos.
Começando pelos OIC, a sua liquidação judicial passa a reger-se, em geral, pelo disposto no Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), aprovado em anexo ao Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de Março, com as especificidades previstas no RGA. Adentro destas especificidades, o mesmo RGA passa a prever que os OIC dissolvidos são alvo de liquidação judicial, em caso de declaração de insolvência, bem como em caso de revogação da sua autorização pela CMVM ou da impossibilidade de substituição da sociedade gestora, promovida pela CMVM 2.
Em geral, a dissolução determina a imediata e irreversível entrada em liquidação do OIC, deixando de ser possível a reversão da liquidação de organismos de investimento alternativo (OIA) de subscrição particular, admitida na vigência do RGOIC 3.
O depositário, atentas as suas especiais responsabilidades de controlo e fiscalização da actividade dos OIC no interesse dos participantes, passa a ser incluído no elenco das entidades com legitimidade para requerer a declaração de insolvência.
O conceito de “dissolução”, que dá lugar a liquidação judicial, passa a referir-se a realidades distintas: a dissolução de OIC coincide com a declaração de insolvência; no caso de revogação da autorização pela CMVM ou da impossibilidade de substituição da sociedade gestora, promovida pela CMVM, a “dissolução” coincide com a decisão da CMVM que tal determina, devendo a mesma CMVM promover no tribunal competente, a liquidação do OIC no prazo de 10 dias úteis após a dissolução. Ou seja, nestes casos a mencionada decisão da CMVM produz os efeitos da declaração de insolvência.
Totalmente inovador no RGA, relativamente ao regime do CIRE, é a circunstância de a CMVM poder propor o “liquidatário judicial” ou os “membros da comissão liquidatária” a designar pelo Juiz, bem como a remuneração a auferir pelos mesmos, aos quais competirá o exercício de funções do “administrador da insolvência” (AI) ao abrigo do CIRE. Assim, no despacho de prosseguimento a proferir pelo juiz nos casos de decisão da CMVM que produz os efeitos da declaração de insolvência, o juiz verifica exclusivamente a cópia da decisão da CMVM que lhe seja apresentada e procede, em alternativa, à nomeação do AI ou, quando requerido pela CMVM, do liquidatário ou da comissão liquidatária, para além de se pronunciar, parcialmente, sobre vários aspectos inerentes à sentença de declaração de insolvência previstos no art. 36º do CIRE.
A declaração de insolvência de OIC não faz cessar nem suspende o contrato entre a sociedade gestora e o depositário, mantendo este deveres de guarda de activos e de outras funções, sem prejuízo de o AI, o liquidatário judicial ou a comissão liquidatária o poderem, a qualquer momento, substituir.
Como regime excepcional relativamente ao disposto no art. 49º do CIRE, pelo RGA são pessoas especialmente relacionadas com o OIC, para efeitos de classificação de créditos e de resolução em benefício da massa: i) a sociedade gestora, à data da declaração de insolvência e nos 2 anos anteriores à data de início do processo de insolvência ou, caso esta data não seja aplicável (decisão CMVM), nos 2 anos anteriores à data da declaração de insolvência; ii) os administradores de direito ou de facto dessa sociedade gestora; iii) os participantes de OIC fechados que fossem titulares da maioria das respectivas Unidades de Participação no referido período.
Para efeitos de fixação de residência e de eventual afectação pelo incidente de qualificação de insolvência (como culposa ou fortuita) devem ser considerados os administradores da sociedade gestora.
Finalmente, o disposto nos títulos IX (adopção de um Plano de Insolvência) e X (Administração da Massa Insolvente pelo devedor) só é aplicável na liquidação judicial de OIA dirigidos exclusivamente a investidores profissionais.
No que tange às sociedades gestoras, as mesmas consideram-se dissolvidas, para efeitos de liquidação judicial em processo de insolvência nos termos do CIRE, em caso de declaração de insolvência ou “caso não cesse imediatamente o exercício das actividades cuja autorização foi renunciada ou revogada ou não promova as alterações ao respectivo objecto social e, caso aplicável, à firma” 4, cfr. declaração da CMVM, que promoverá no tribunal competente a liquidação da sociedade gestora, no prazo de 10 dias úteis contados dessa declaração.
Como nota mais marcante do regime especial de liquidação judicial das sociedades gestoras previsto no RGA sublinhamos que o AI deve promover, no prazo máximo de 60 dias a contar da declaração de insolvência ou do despacho de prosseguimento judicial fundado na declaração da CMVM, a substituição da sociedade gestora, sem dependência do consentimento da Comissão de Credores. Caso o não faça, pode a CMVM fazê-lo para cada um dos OIC, para preservar o regular funcionamento do mercado, e não sendo a substituição possível em tempo adequado, pode ordenar a liquidação dos OIC em causa.
Finalmente, sob proposta da CMVM pode o juiz designar pessoa ou pessoas que cumpram os requisitos de adequação exigíveis aos administradores das sociedades gestoras em causa para coadjuvarem o AI, a expensas da massa insolvente.
Liquidação judicial de OIC e de sociedades gestoras: as novas regras do RGA, por Manuel Camarate Campos.
1 Cfr. arts. 251º e 254º do RGA.
2 Cfr. art. 247º alíneas e) a g) e 251º, nº 1 do RGA. Vidé também art. 2º, nº 1, alínea h) do CIRE.
3 Cfr. art. 249º, nº 2, alínea a) do RGA e art. 48º do RGOIC. A norma transitória do art. 7º nº 5 do Decreto-Lei nº 27/2023 prevê todavia que os procedimentos pendentes de reversão de liquidação de OIA de subscrição particular prosseguem os seus termos à luz do regime anterior.
4 Art. 252º, nº 2, alínea b) por remissão do art. 254º, nº 1 alínea b) do RGA.

Antena Aberta – O Novo Regime de Gestão de Activos
Esta Antena Aberta da RSA, irá incidir sobre o Novo Regime da Gestão de Ativos (RGA), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 27/2023, 28 de abril, e que entra em vigor a partir de 28 de maio de 2023.
Esta sessão será interativa, com perguntas e respostas, e poderá participar na sessão Zoom.
Oradores:

Legal Alert – A Revisão ao Regime das Sociedades Anónimas Desportivas (SADS)
Em Portugal, atualmente, as SAD são regulamentadas pelo Decreto-Lei no 10/2013, de 25 de janeiro, que estabelece o regime jurídico das sociedades desportivas. Este regime define as regras para a constituição, organização, gestão, supervisão e extinção dessas sociedades.
As SAD são empresas que têm como objetivo principal a prática desportiva profissional, sendo geralmente utilizadas para gerir as equipas profissionais de futebol, sendo obrigadas, portanto, a cumprir requisitos específicos de organização e gestão, bem como a cumprir as normas aplicáveis a todas as empresas em Portugal previstas no Código das Sociedades Comerciais (CSC), bem como as leis fiscais e laborais.